Historietas (1)

Historieta 01: Foi por influência de um grande cientista alemão, Konrad Lorenz, fundador da investigação comparativa de comportamento, pai da Etologia, estudo do comportamento animal, através de um livro chamado “Falava com as bestas, as aves e os peixes”, que me foi presenteado pelo colega Joaber da Universidade, que comecei a falar com os bichos. Não falar como se fossem bestas. Falar como falo com qualquer pessoa. Quando me dirijo a um cachorro não costumo fazer aquela voz infantil que ouço freqüentemente os outros fazerem. Saúdo-os como adultos e seres capazes de compreender. Sei de gente que conversa a sério com as plantas e afirmam que elas se desenvolvem e crescem viçosamente. Quem quiser achar que é loucura ou efeito de aposentadoria e contestar pode, mas antes tem que fazer a experiência. Não acredito em nada que não podem me provar e não desacredito em nada que não possa provar ao contrário. Quando duvido, experimento.

Foi assim, com esse pensamento, que cheguei um dia na casa de uma minha amiga e ela me falou que a gata de estimação do irmão, que estava passando uns dias com ela, enquanto ele viajava, tinha escapado pela sacada, de um andar alto do edifício, se refugiado na sacada do vizinho do lado e não queria voltar. Minha amiga não estava muito feliz com a gata soltando pêlos pelos móveis e o bicho tinha percebido, certamente. Eu falei que iria tentar convencê-la a voltar. Cheguei na sacada e, em princípio não entendi como o bicho tinha feito para ir para onde estava. Depois percebi uma pequena saliência na parede e conclui que ela tinha feito uma proeza, inconsciente da altura em que estava. Foi então que falei com ela, como se estivéssemos num colóquio entre vizinhos: “E aí, garota, como estão as coisas por aí? Passeando?”. E ela me olhava intrigada, com cara de “esse cara é mais louco do que eu”. Falei: “Não queres vir para cá? Vem, vamos bater um papo!”. Acho que o tom de voz foi tão convincente que ela rapidamente deslocou-se sobre a pequena saliência da parede e miou aos meus pés. Missão cumprida.

Historieta 02: Milton Nascimento tem sua Paula e Bebeto (eles se amam é pra vida inteira, à vera) eu tenho Paulo e Giovana. Foram meus estudantes, ele num ano obteve nota dez em todos os trabalhos que fez, ela no ano seguinte obteve nota dez em todos os trabalhos que fez. As provas dos dois eram de dar inveja ao professor. Como Salieri examinando as partituras do Mozart, eu pensava que eu queria ter escrito aquilo se eu fosse estudante. Ambos são tímidos e modestos, apresso-me em contar, uma vez que a vaidade e arrogância seriam até explicáveis no caso deles. A turma do Paulo me convidou para paraninfo. Fiz um discurso emocionado, que Giovana estava filmando e, quase estragou a filmagem, pois chorava enquanto filmava. Quando resolveram casar, convidaram Cleuza e eu para padrinhos de casamento. Fomos para Caxias, nos arrumamos num hotel e fomos para a igreja. Estávamos todos lá, padrinhos, no altar e o Paulo esperando, nervoso. A igreja cheia. Eis que chega a noiva, linda, com seu olhar penetrante e brilhante. Eles se olham e desandam a chorar, os dois, Paulo mais ainda, não se contem, nem faz questão. A mãe do Paulo não ensinou para ele que homem não chora. Ainda bem. Naquele momento eles espalharam emoção no mundo. As pessoas que estavam ali aprenderam algo muito importante.

Na festa do casamento passam o microfone para que os convidados digam algumas palavras para os noivos. O pai da Giovana me exorta à moderação, pois na formatura tinha se emocionado com o meu discurso. Começo a falar sobre os dois, mas como não ser emocional tratando-se deles? Mais tarde soube que a avó da Giovana tinha ido para o hospital durante a festa. Fico me sentindo culpado. Mas, era vaidade minha, ela passara mal por problemas pessoais.

Eles se amam e é pra vida inteira, de verdade.

Até hoje quando nos encontramos trocamos muita energia positiva, muito amor velado, sem palavras.

A gente se ama e é pra vida inteira, de verdade, como amigos do peito.