Deu-me agora para chorar aqui
Como está este teu coraçãozinho? Não sei, nem quero saber, não me interessa a ponta de um corno. Literalmente.
E soletro para não haver lugar a dúvidas: p,o,n,t,a,d,e,u,m,c,o,r,n,o.
Ou será como vai o tesão? Soletro esta outra palavra: t,e,s,a,o.
Não me interessa também, o que me interessa deveras, juro por mim próprio, é tirar toda a ferrugem que acumulei na cabeça em vinte, talvez trinta anos, no buraco de São Miguel.
A ferrugem começou a despregar-se, a estalar, a saltar, a saltar com estrondo, tanto que até me assustou, tive medo que algum pedaço pudesse danificar as obras de arte ali por perto, na Modern Tate, em Londres. A partir daquele sábado, pouco antes das 10 da noite, tenho chorado ao ver Rembrandt, Van Gogh, Miro, Andy Warhol e outros tantos e tantos que fazem parte das minhas raízes.
Dou por mim a chorar que nem uma Maria Madalena pecadora. Não me escondo. Não vou à casa de banho disfarçar o choro. Nem nada. Sou o que se vê.
Isto a propósito do primeiro quadro que quis ver aqui no museu de Van Gogh: o auto-retrato de 1887.
Devo continuar a ser sincero e dizer que o que mais gosto e acima de tudo gosto em Van Gogh são os auto-retratos.
Dão-me o homem que fez o resto.
Devo ainda dizer, continuo a ser sincero, se não acreditarem o problema é vosso, que mal escrevi isto no caderno, o tal novo que comprei segunda-feira passada numa papelaria de Wimbledon, senti logo uma vontade tremenda de o passar no computador e vim sentar-me de novo aqui na cafetaria do museu.
Será esta a loucura branda mas possessiva que me atrai aqui?
E atrai toda esta gente?
Mário Moura
Museu Van Gogh
22 de ulho de 2010