O encontro / O ser humano

O ENCONTRO

Guida Linhares

Andava cansada a Deusa da Sabedoria, em tempos tão modernos, em que cada um cuidava de ter cada vez mais, sentir-se cada vez melhor, acumular riquezas materiais e deitar-se serenamente sem refletir sobre o homem e suas circunstâncias. Tão esgotada de filosofar em vão, sentou-se à beira de uma estrada e viu surgir uma mulher, que trazia em si mesma as marcas da vida, mas que nada nem ninguém a fizeram parar de buscar a sabedoria. Assim quando as duas se entreolharam, reconheceram-se imediatamente.

A mulher trazia uma bagagem de escritos, frutos de suas observações e vivências, e a Sabedoria desvela-se demais em todos os aspectos que movem o ser humano, quando eles são colocados na balança que equilibra razão e emoção. Assim a Deusa tirou o véu da balança e pediu à mulher que nela depositasse suas emoções e sentimentos, e a mulher surpreendida assim o fez.

Cuidadosamente foi separando toda a razão que a levou a agir desta ou daquela forma, assim como com sentimentos profundos, foi colocando todos aqueles em que agiu sob a égide da emoção pura . Os pratos da balança subiam e desciam à medida que cada sentimento era acrescentado, ora razão, ora emoção, até que toda a sua bagagem se completasse.

E neste momento, ambas se entreolharam de novo. A Deusa da Sabedoria,

sorriu satisfeita. Não foi em vão o seu ensinamento. Não foi em vão, tanto tempo tentando mostrar a homens e mulheres, que todos podem ser melhores, apenas pelo fato de refletir sobre as coisas da vida, ouvindo a vóz interior e tendo como juiz a própria consciência.

A mulher surpresa via o perfeito equilíbrio da sua balança. Não imaginara que suas verdades não teriam sido meros palpites, mas sim a vóz da sua sabedoria interior. Não imaginara que ser alguem como era, representava não ser aquilo que os outros queriam que ela fosse, mas sim o que ela era, e sempre foi, a senhora do seu querer, receptiva apenas ao querer de Deus.

E mesmo ao se declarar inocente em suas conclusões, esta grande mulher trouxe aos nossos olhos, um ensinamento: não adianta discutir o "sexo dos anjos" se somos controvertidos, mas se olharmos tudo com a simplicidade da alma,conseguiremos perceber que a cada momento, encontraremos uma nova maneira de entender o ser humano, por ser tão multifacetado quando as estrelas do infinito.

Santos, SP

10/12/06

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Duas prosas> Guida respondendo a Terê

O ser humano

Tere Penhabe

Porquê somos seres tão controversos...?

Porquê desperdiçamos tanta vida discutindo o "sexo dos anjos"...?

São perguntas que me rondam em dias de reflexão, em dias que não compreendo

algo que vejo, que sinto, que sofro...

Se eu amo a vida e o ser humano, se sou grata por estar aqui nesse aprendizado

tão precioso que é viver, porquê sinto necessidade de justificar meus atos, porquê

nem sempre compreendo os atos alheios, diante de contradições tão gritantes

que me abordam?

O ideal seria concordar plenamente com o rico legado de Shakespeare:

_"To be or not to be... that is the question". _

Parece incontestável, porém nem tanto... ser ou não ser, nem sempre é a questão...

porque somos hoje, o que gostaríamos de ter sido ontem, o que não conseguiremos

ser amanhã, e a verdade passa a ser transitória... ou não?

O nome de uma comunidade que eu participei, "Nossas verdades são só palpites",

da qual me desliguei por não aceitar as diretrizes colocadas e impostas aos

participantes... seriam elas corretas? Teria eu, cometido mais um engano?...

Segundo o mantenedor da comunidade, se não houvesse consenso absoluto sobre o

que ele colocava, então não existiria a verdade, por isso me senti na obrigação de

me excluir, porque não poderia aceitar que para acreditar no amor, todos teriam

que acreditar também... mas será que era eu que estava errada, e a minha verdade

não passa de mero palpite?

Voltando ao nosso tema... o ser humano...

Se a memória é o pico, o núcleo central da antropologia, porque nos comportamos

de maneira diferente daquela que aprendemos, porque não somos fiéis à nossa

memória em todos os momentos da nossa vida?

Se SOU um ser que acredita no ser humano, não deveria me decepcionar nunca,

porque a crença seria um componente básico meu, do "ser ou não ser" que habita em

mim... mas não é assim... e então eu tenho que mudar, ser outro ser, não ser mais o

ser que eu gostaria de ser.

Imagino que os sábios, pensadores, as grandes mentes brilhantes que habitaram o

mundo, não tinham dúvidas como eu, porque tinham a sabedoria que Deus lhes deu,

e não deu a mim... mas porquê, se eu queria tanto!?

Seria simplesmente pelo que eu li em algum lugar, infelizmente sem menção ao autor,

mas que me fez parar para pensar em tantas mensagens de auto-ajuda que leio e acho

brilhantes, mas que não seriam tão brilhantes, se essa frase perdida no universo fosse

uma verdade..."O QUERER É SEU. O PODER É DE DEUS."

Mais do que qualquer riqueza deste mundo, mais do que fama, glória, realizações

pessoais e profissionais, o reconhecimento por algo que eu faça com dedicação e amor,

mais do que ser amada, que é algo que sempre cito em meus poemas... eu queria

simplesmente ser sábia!

E tudo o mais, estaria incontestavelmente resolvido.

Mas tenho que admitir que nesse momento, pelo menos para mim, um autor

desconhecido foi mais brilhante que Shakespeare, porque o "querer" é meu, mas o poder

é de Deus... e ele não me deu a sabedoria que almejo.

Se você leu até aqui, verá que a minha crônica não teve conclusão satisfatória, como eu

gostaria que tivesse.

Peço desculpas se não encontrar nenhuma valia no que leu, mas declaro-me inocente

porque... faltou-me sabedoria.

Santos, 09.12.2006

www.amoremversoeprosa.com

Guida Linhares
Enviado por Guida Linhares em 11/12/2006
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