Figuras de rua
Todas as cidades do mundo têm suas figuras de rua. Umas mais, outras menos. Cada uma delas no entanto, com suas figuras bem peculiares. Jataí, cidade do sudoeste de Goiás bem que poderia candidatar-se ao título de cidade, onde existe, ou melhor, existiram as figuras de rua mais interessantes de todo o orbe. Quem reside, ou residiu por lá há mais de 40 anos sabe perfeitamente do que estou falando. Certamente se lembrará do senhor, Deodato, um maníaco, considerado o admirador mor de Marta Rocha, ex-miss Brasil. Se lembrará ainda de muitos outros. Para não se cometer injustiça com qualquer um deles, serão destacados nas linhas abaixo, de acordo com seu grau de importância no contexto das proezas de cada um.
O Pedro Doido, um moralista nato, perambulava à pé por várias cidades do sudoeste goiano e por algumas de Mato Grosso, mas que, de quando em quando, surgia em Jataí. Como apregoava a higiene do corpo, aproveitava-se então quando aparecia, para dar banho na sujismunda, Geralda Doida, figura importantíssima, em termos de proferir palavrões do mais baixíssimo calão, não respeitando nem as mocinhas da cidade, que dela cortavam volta. Geralda, além da boca porca, era genitora de uma outra figura, o famigerado, Kardec, um dos grandes pertubadores do sossego público e famoso por envolver-se com transeuntes daquela cidade.
O Zé Poeira, outro interessantíssimo, de cor negra, descendente de africanos, sempre montado em uma égua, anunciava alegremente sua chegada nos logradouros por onde passava para tomar sua santa cachaça de todas as horas, motivo pelo qual, sempre tinha os olhos da cor de brasa avermelhada. Esse cidadão precisaria de um capítulo à parte, pois além de suas peripécias, estava sempre em litígio com o policiamento local. Dava um trabalho danado.
Existia um nobre, o Zé Majorinho, descendente dos fundadores da cidade, tinha também mania de higiene. Sempre limpo e impecável, trajava ternos com gravata e carregava no bolso do paletó uma garrafinha contendo alcoól. Quando alguém lhe esbarrava, mesmo despropositadamente, não titubeava, passava alcoól no local e saia de fininho como se nada ocorrera.
Já o Zé Toquinho, figura bem folclórica, era de cor negra e adorava dar suas risadas espalhafatosas. Trazia sempre no canto da boca, o indispensável charuto grosso e fedido. Por ser rechonchudo, de baixa estatura e cabeçudo, parecia mais um duende. Agora o mais adorado da criançada, o Zé Gravatinha, sempre sorridente, parecia ter saído da Disneylândia, tamanha a alegria contagiante que passava à todos, crianças e adultos. Com suas roupas multi-coloridas, era o xodó da gurizada. Esse, sim, tinha simpatia de sobra.
Um outro figuraço, o Anjo, um albino que por causa de sua pouca visão, se apoiava num pedaço de pau que trazia consigo, mas que, às vezes servia como porrete para rechaçar a zombaria da meninada que não lhe dava trégua, deixando-o furioso, com justa razão. Falarei agora de um, também figuraço, o Capireca. Quem de lá não se lembra dele? Esse sim, era temido e respeitado por muitos, dado a sua figura grotesca, assemelhando-se muito com o incrível ``Hulk``, mas que na realidade era um pobre sofredor.
Essas são as figuras de rua mais importantes daquela cidade, mas para não cometer quaisquer deslizes com a memória da cidade, esclarece-se que a lista é bem maior, podendo inclusive afirma-se que além dessas figuras de primeira grandeza, existiram mais algumas outras que não foram citadas, mas que fizeram parte do cotidiano da cidade de Jataí por várias décadas, tais como, a Maióia; o Coiô, cujo nome verdadeiro era Conostiba Castelo Branco; João Pinho; Maria Queimada; o Gabiroba, que falava fluentemente o English e outros, cujo modo inusitado de viver, com seus trejeitos, peripécias, roupas psicodélicas e transbordando alegria , se inseriram nos anais da história da cidade e em nossos corações, como anjos de luz, marcando indelevelmente suas presenças em nossas vidas.