SHOPPING
Ainda é cedo, mas um razoável número de pessoas ja está de prontidão aguardando a abertura das portas do "shopping" que os atrai como gigantesco imã.
Dentro de mais uma ou duas horas, vamos ter alí dentro, como formigas catando alimento, um mundo de gente em frenético movimento.
Você já ouviu um "shopping"? Pois então, na primeira oportunidade, ouça.
A diversidade de sons que se mesclam é tão grande que tem como resultado um rom-rom que lembra o que faz uma turbina bem azeitada. É, até, inquietante, pois também evoca o de abelhas prestes a atacar.
Vá andando pelos largos espaços com pisos de termas romanas, ladeados por vitrinas luminosas, letreiros sugestivos (por que quase todos em inglês?) que expõem tudo aquilo que o tão combatido consumismo anseia.
Depois, você vai esbarrar num espaço proibido terminantemente aos que, por vaidade ou necessidade, encaram um regime brabo: chama-se Praça de Alimentação. Alí, meu caro, você é atacado visual e olfativamente por tudo aquilo que Pantagruel sempre sonhou. Alí você acaba por não saber o que escolher, fica zanzando de um lado para o outro e, quando se decide, almoça e depois se arrepende de não ter ido para aquele dos camarões ou das massas. Esse é o reino da Gula, um pecado mortal, mas galhardamente ignorado por grande parte dessa gente, que ameniza a grave falta tomando uma bebida "diet" junto com a maior feijoada!
No meu campo de visão, percebo uma pequena família que acaba de entrar: pai, mãe e filho.
Eles vinham em trajetórias paralelas, mas, em dado momento, guinam 90° e um vai para o norte e outro para o sul. O menino opta pela mãe que o leva pela mão.
O homem vai direto para a loja dos eletrônicos (o que já fez um milhão de vezes) e fica namorando aquela câmera digital, 12 mega pixel, HD "que um dia eu venho aquí buscar, ah se venho".
A mulher (é claro) é arrastada para a "butique" e (o que já fez um milhão de vezes) fica namorando aquele vestido preto, com generoso decote e o discreto colar de pérolas que compõe o manequim "que um dia o Alfredo vai ter que comprar pra mim, ah se não vai! Nem que eu tenha que arrumar duas TPM no mesmo mês!"
De tão extasiada, esquece o menino que, valendo-se disso, escapa e entra numa loja de brinquedos.
Instintivamente, a mãe - ainda deleitada com a visão - põe o braço para trás e palmeia procurando o filho. Sem contato, volteia procurando-o e não o vê. Para não fugir à regra, apavorada, berra: JOÃOZINHO - JO-ÃO-ZI-NHOOO! Do outro lado, acostumado a esse tipo de coisa, o pai nem desgrudou os olhos daquela belezura de câmera.
Ao segundo espalhafatoso chamado aparece o Joãozinho, saindo da loja e sobraçando uma enorme caixa de "play station".
Minha gente, quem tem um filho com cabelo espetado já vai ter bastante trabalho. Agora, um de cabelo espetado e que se chama Joãozinho, aí, senhora, você certamente arrumou um grande "chuta-canelas". Enfim, resolve-se tudo e seguem seu caminho, com os pais segurando as mãos do menino, que ensaia um sapateado digno do Fred Astaire.
Felizmente, de volta à paz!
Agora, noto aquele senhor que está parado à entrada da escada rolante. Veste-se informalmente, mas com apuro e usa óculos escuros. Sua cabeça parece voltada para o chão em atitude contemplativa, talvez, como eu, ouvindo o "shopping", era o mesmo que, momentos atrás, eu vira "analisando" por cima dos óculos uma gentil senhorinha que passava.
De repente, uma suave mão repousa sobre o seu braço e uma mansa voz lhe diz:
- Eu vou ajudá-lo, senhor.
Depois, com uma bondosa recriminação, conclui:
- Mas o senhor não deveria andar por aí sozinho e ainda mais sem a bengala branca!!
Ainda é cedo, mas um razoável número de pessoas ja está de prontidão aguardando a abertura das portas do "shopping" que os atrai como gigantesco imã.
Dentro de mais uma ou duas horas, vamos ter alí dentro, como formigas catando alimento, um mundo de gente em frenético movimento.
Você já ouviu um "shopping"? Pois então, na primeira oportunidade, ouça.
A diversidade de sons que se mesclam é tão grande que tem como resultado um rom-rom que lembra o que faz uma turbina bem azeitada. É, até, inquietante, pois também evoca o de abelhas prestes a atacar.
Vá andando pelos largos espaços com pisos de termas romanas, ladeados por vitrinas luminosas, letreiros sugestivos (por que quase todos em inglês?) que expõem tudo aquilo que o tão combatido consumismo anseia.
Depois, você vai esbarrar num espaço proibido terminantemente aos que, por vaidade ou necessidade, encaram um regime brabo: chama-se Praça de Alimentação. Alí, meu caro, você é atacado visual e olfativamente por tudo aquilo que Pantagruel sempre sonhou. Alí você acaba por não saber o que escolher, fica zanzando de um lado para o outro e, quando se decide, almoça e depois se arrepende de não ter ido para aquele dos camarões ou das massas. Esse é o reino da Gula, um pecado mortal, mas galhardamente ignorado por grande parte dessa gente, que ameniza a grave falta tomando uma bebida "diet" junto com a maior feijoada!
No meu campo de visão, percebo uma pequena família que acaba de entrar: pai, mãe e filho.
Eles vinham em trajetórias paralelas, mas, em dado momento, guinam 90° e um vai para o norte e outro para o sul. O menino opta pela mãe que o leva pela mão.
O homem vai direto para a loja dos eletrônicos (o que já fez um milhão de vezes) e fica namorando aquela câmera digital, 12 mega pixel, HD "que um dia eu venho aquí buscar, ah se venho".
A mulher (é claro) é arrastada para a "butique" e (o que já fez um milhão de vezes) fica namorando aquele vestido preto, com generoso decote e o discreto colar de pérolas que compõe o manequim "que um dia o Alfredo vai ter que comprar pra mim, ah se não vai! Nem que eu tenha que arrumar duas TPM no mesmo mês!"
De tão extasiada, esquece o menino que, valendo-se disso, escapa e entra numa loja de brinquedos.
Instintivamente, a mãe - ainda deleitada com a visão - põe o braço para trás e palmeia procurando o filho. Sem contato, volteia procurando-o e não o vê. Para não fugir à regra, apavorada, berra: JOÃOZINHO - JO-ÃO-ZI-NHOOO! Do outro lado, acostumado a esse tipo de coisa, o pai nem desgrudou os olhos daquela belezura de câmera.
Ao segundo espalhafatoso chamado aparece o Joãozinho, saindo da loja e sobraçando uma enorme caixa de "play station".
Minha gente, quem tem um filho com cabelo espetado já vai ter bastante trabalho. Agora, um de cabelo espetado e que se chama Joãozinho, aí, senhora, você certamente arrumou um grande "chuta-canelas". Enfim, resolve-se tudo e seguem seu caminho, com os pais segurando as mãos do menino, que ensaia um sapateado digno do Fred Astaire.
Felizmente, de volta à paz!
Agora, noto aquele senhor que está parado à entrada da escada rolante. Veste-se informalmente, mas com apuro e usa óculos escuros. Sua cabeça parece voltada para o chão em atitude contemplativa, talvez, como eu, ouvindo o "shopping", era o mesmo que, momentos atrás, eu vira "analisando" por cima dos óculos uma gentil senhorinha que passava.
De repente, uma suave mão repousa sobre o seu braço e uma mansa voz lhe diz:
- Eu vou ajudá-lo, senhor.
Depois, com uma bondosa recriminação, conclui:
- Mas o senhor não deveria andar por aí sozinho e ainda mais sem a bengala branca!!