Os e-mails que trocavam

Aquele fora um ano marcado por grandes mudanças. Aos 36 anos, Mirtes ficara viúva, em pleno início de século XXI. Dois filhos para educar, cujas idades, tão próximas, eram de deixar qualquer mãe à beira da loucura. Seu marido os deixara em apenas cinco curtos meses, após a descoberta da doença. Jorge era um bom pai, mas isso não se refletia no papel de esposo. Mirtes sentia-se mal com a viuvez, mas não estava em luto, em seu coração. Às poucas amigas confidentes, costuma dizer que era “viúva de marido vivo”, antes mesmo do falecimento de Jorge. O dinheiro era trazido para casa, sistematicamente. Nada lhes faltara. Casa boa, carros novos, empregada, comida farta, e vida sem emoção.

Abater-se perante a realidade era tudo o que ela não faria. Forte em seu caráter, decidida, inteligente, intelectual e com potenciais ímpares, resolveu viver a sua maneira.

Sua idade jamais era respeitada pelo espelho. Na verdade, esse sempre fora seu grande amigo. Seu belo porte, cabelos e pele bem tratados, magra por natureza combinavam perfeitamente com seu jeito de ser. Olhares nunca lhe faltaram quando saia às ruas. E foi num desses olhares, que sua vida ganhou novo rumo.

Denis achegara-se à Mirtes sem qualquer vergonha ou medo. Ambos no mesmo restaurante, a casualidade os fez conhecer.

Mesmo sabendo da diferença de idade, ele a desejou assim que a viu. Poucas horas de conversa, Denis conheceu alguns detalhes sobre a vida de Mirtes, e isso o enfeitiçou, porque jamais conhecera uma mulher tão despojada e aberta. “Aquela poderia ser a mulher de seus sonhos”, pensava Denis em plena confusão de pensamento e coração palpitante. Mas, o relógio os despertou para a vida que acontecia, além daquela mesa. Como se faz em início de amizade trocaram números de telefone, endereço virtual e sugestões de próximos encontros.

Mirtes, que conhecia o quanto o seu coração já a enganara noutras ocasiões, alegrou-se com Denis, mas fincou os pés no chão. Tudo lhe era novo. Flertar com alguém mais jovem, jamais tinha lhe acontecido. Pensava sem cessar no refrão de uma música, da sua juventude, cujo refrão era “I’m alive”, e isso a fazia rir sozinha, dando a entender que realmente estava viva por dentro e por fora.

Telefonemas, mensagens pelo celular, e-mails começaram a fazer parte da rotina deles. Ela vivia cada momento como se tivesse rejuvenescido quinze anos. Alguns encontros aconteceram, e aos beijos eles se dedicavam, sem permitir que alguma intimidade falasse mais alto.

“Dois adolescentes apaixonados”, dizia Paula, amiga fiel de Mirtes desde sempre.

Sábado à noite, pronta para sair, quando seu celular toca. Era Denis. Deixou o telefone tocar três vezes, para não dar a impressão de que estava colada ao aparelho, à espera da ligação do seu “namoradinho”. Sentia um frio na espinha conforme Denis lhe pronunciava algumas duras palavras, deixando claro que aquele caso não era mais o seu ideal de vida.

Sozinha, sentada na bela escadaria de mármore de sua casa, sentiu-se ferida por Denis. Ele não lhe prometera romance sério, ou assumir uma relação. Ali, no frio do mármore e sem se mexer, fez um pequeno “flashback” em seus pensamentos, riu sozinha, balançou a cabeça e levantou-se.

Restaram alguns e-mails e nada mais.

Silvana Goes
Enviado por Silvana Goes em 25/07/2011
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