83 Ainda vou ser atropelado em Amesterdão por uma bicicleta
83 Ainda vou ser atropelado em Amesterdão por uma bicicleta
Tenho à minha frente, a tomar o pequeno-almoço, a família funcional que tive atrás de mim na fila de entrada do museu Van Gogh: um casal com um casal de filhos. Falam espanhol ou outra língua qualquer de Espanha que eu não reconheço. Basco? Catalão?
Ainda não me apeteceu ver a colecção, antes vou passar este texto. Comecei e acabei a escrever isso no ‘tramway’ a caminho daqui. Depois logo se vê.
Ainda vou ser atropelado por uma bicicleta antes de regressar amanhã à tarde a Paris.
São tantas, vêm de trás, da frente, dos lados, de todos os lados, quase silenciosas, já as vemos em cima de nós, que todos os olhos ainda serão poucos para evitar um atropelamento. Fui já quase atropelado duas vezes: ontem, à saída do Rijks, e há poucochinho de tempo atrás antes de apanhar o ‘tram’ n.º 2 para o Van Gogh.
Foi por uma unha negra ou terá sido por um reflexo instintivo que o evitei?
Desatei a rir nas duas vezes e lembrei-me (…) faço uma pausa: a mãe da família funcional levanta-se e tira uma fotografia, da frente, primeiro, o pai come plácido, depois atrás. Ternurento.
Ninguém riu, só eu. Parece que toda a gente aqui anda de bicicleta. Há bicicletas por todo o lado. São simples, contudo. Melhor, são, funcionais. Parecem ser quase todas iguais. São quase todas iguais nas cores (poucas variações) e na forma (são poucas as que sobressaem) ou na marca (não tenho reparado no pormenor), mas, se há marcas distintas, e haverá certamente, não dão nas vistas.
Estou a bordo de um ‘tramway’ que passa pelo museu Van Gogh, ao longo do percurso, de ambos os lados da rua, mais uma avenida larga, mas não tão larga como as mais largas de Lisboa, funcional e bonita, bicicletas e mais bicicletas estacionadas. Acorrentados e fechadas a cadeado. Reparei melhor ontem à noite. Já reparara á tarde.
São quase nove horas e meia da manhã, às dez, o Van Gogh abre: são menos os ciclistas do que as bicicletas. Ontem á tarde, pelas seis da tarde, seriam outro tanto.
São onze e vinte e cinco da manhã, creio estar agora preparado para ver Van Gogh. Até logo.
Mas antes, acho que vou ainda tomar um segundo café forte. Dois euros, por favor?
Mário Moura
Amesterdão, 22 de Julho de 2010