Novos caipiras

Zé Rodrix e seus amigos Sá e Guarabyra lançaram em meados da década de 1960 o que chamavam de rock rural. Um gênero de música que tinha o batidão do rock, mas que falava sobre o interior do país. Nos presentearam com belas músicas nesse novo estilo.

Eis que chegamos ao novo milênio com um catatau de novos gêneros, sendo o sertanejo universitário um deles. Para os puristas, vivemos no pior dos tempos e a maior prova disso são esses gêneros novos, formados as fusões de outros gêneros, alguns conflitantes.

Eu acredito que a música tem sua dinâmica e que novas combinações são seu destino. Contudo devo reconhecer que os gêneros possuem essências e algumas são diferentes entre si.

O que entendemos por sertanejo? Sertanejo atualmente é uma música cantada por uma dupla que fale mais sobre amor do que sobre o campo. O que hoje chamamos de sertanejo é o resultado da união do country norte-americano com a "música de raiz". Difícil dizer quando o atual sertanejo começou, mas é visível que Leandro e Leonardo, Chitãozinho e Xororó e Zezé di Camargo e Luciano tiveram um papel importante nesse processo.

E a música de raiz? Uma das coisas mais difíceis de precisar é o nascimento da música de raiz, a música caipira. O que sabemos é que ela tem origem na fusão de muitas tradições musicais: a portuguesa nas letras, a africana nos ritmos, a indígena nos instrumentos, etc. A influência da Igreja Católica é muito forte, afinal a maior manifestação dessa música era através dos folguedos e festas religiosas, o centro da vida social do caipira.

A música de raiz, contudo, varia de região para região. No Nordeste, ela deu origem ao baião, ao forró, ao repente, etc. A cultura popular é plural e muitas vezes anônima, o que não nos permite precisar ou generalizar.

O interessante é que em muitas regiões, principalmente no Sul de Minas e no interior de São Paulo, ela também é conhecida como "cebolão", pois fazia as pessoas nas festas chorarem.

Chorarem? Sim, a música sertaneja é na realidade um retrato da vida dura no campo. Nela encontramos relatos de injustiças, de lutas e de tragédias. Nunca me esqueço da música cantada por Tonico e Tinoco, "Boi Soberano", que narra uma tragédia parecida com a do "Menino da Porteira".

Mas nem só de tristeza vive a música sertaneja, afinal ela também está povoada de passagens fantásticas e alguns causos. Mas um dos grandes temas, com certeza, seja o amor. O homem do campo possui um romantismo assim meio comedido na música. Para mim, o compositor Simplício representou muito bem isso em suas elegias para as caboclas.

A geração dos anos 80 e 90 não abandonou totalmente essa temática, mas incorporou elementos novos, como dissemos. Hoje, a maioria das músicas sertanejas são reconhecidas como músicas românticas. Talvez porque ela tenha sido trazida para as cidades, onde os ouvintes não se identifiquem mais com o viver rural representado nas músicas de antes. As gravadoras não são bobas, sacaram isso na hora e desde então tem se aproveitado desse filão rotulando-o ora como música sertaneja, ora como música romântica, deixando tudo muito claro.

Onde entra o sertanejo universitário? Claro que existe a questão da moda, mas não é só isso. Descobri que muitos estudantes, a maioria jovens de classe média, se encantam realmente pela música sertaneja, seja ela tanto da geração country como da "velha guarda".

O que motiva esse encanto? Acredito que a vida nas cidades para esses jovens é confortável, mas não tão estimulante. Muitos se voltam para o campo com aquele olhar bucólico, de um mundo diferente, mais verdadeiro e menos artificial.

O que eles procuram não é ressuscitar o modo de vida caipira, mas a sua sensibilidade, seu estilo. Hoje em dia, com tantas mudanças, com tanta história, fica difícil dizer o que é realmente um modo de vida caipira. O modo de vida caipira não nasceu pronto, ele foi se formando com o tempo e é capaz que ele ainda esteja em transformação. Talvez essa geração de jovens da cidade com o coração no campo possa ser, hoje, uma das tantas faces do caipira, ou do sertanejo se preferir.