SER BRASILEIRO CUSTA CARO
Um camarada de todos nós foi viver no interior da França. Em Lion, precisamente. Alugou um apê: por dois dormitórios com cozinha, sala e sacada, paga coisa de setecentos euros. Ou, mais ou menos, mil e quinhentos reais.
Daí está ele surpreso: “como são caras as coisas (aí) no Brasil!”.
O apartamento é a única despesa semelhante aos valores que ele pagava por aqui, no Brasil, e, de resto, por lá, na França, tudo acaba sendo mais barato.
Comida, bebida, vestida, investida... Seja como você estiver: se é para pagar – e não há outra opção – aqui no chão tupiniquim tudo custa um pouco mais.
Claro: estará, caso seja você um mero aquém dos teleshownais, proposto a eriçar a certeza: são os impostos!
Engraçado, por que então na França o tênis da última moda, taxado nos mesmos percentuais do tênis vendido por aqui, custa três vezes menos?
Sabia que no Chile os impostos sobre automóveis são apenas 5% menores dos cobrados aqui, e, no entanto, um modelo idêntico ao que temos em nossas ruas custa quase metade?
Por falar em automóveis: assunto tão proibido no meio, que inclusive há um acordo espiritual entre mídia dominante e indústria, para que não se toque na questão! Quando escapa uma justificativa, elas caem em dois denominadores vulgares: “impostos e custo da mão-de-obra”.
Claro! Um Gol básico por aqui tem o mesmo preço de um Jetta completo para o holandês, deve ser porque, além dos baixíssimos tributos obrigatórios, o trabalhador daquele país recebe muito pouco.
Viva o milionário operário brasileiro! – assim pensa a Volks?
Que chatice! Que falácia! O operário holandês viveria em condomínio aqui no Brasil (considerando o salário por ele recebido em seu país). E quanto aos impostos... O deles tem uma mordida maior.
Como explicar então?
Simples: as montadoras compõem o maior capital produtivo do mundo. Mandam e desmandam. Possuem grana pra cacete! Imagine então... Num lugar que tudo pode, tudo vale, desde que exista dinheiro na mesa...!
Nosso salário é menor. Nossos preços são maiores. Nossos impostos são altos (o dos outros também é!): mas no lugar dos outros, educação, saúde, e/ou outras coisas importantes funcionam. Aqui... Quando passa a funcionar, ou não é tão importante assim, ou funciona sem capricho algum!
Claro: dirá um mais antigo do que eu: “as coisas estão melhorando”.
Mas, o que não entendo: aguardar pra que?
Pra quem eu já sei, e não é pra gente... Mas... Aguardar pra que?
Por que a FIAT brasileira praticamente sustenta toda a crise da FIAT italiana e da outra fatia mundial? Por que eu devo fazer parte disso? Até quando vai? Aguardar pra que?
O lucro das montadoras, como zombou um executivo da Mercedes-Benz, é coisa nossa, particular e brasileira: “se pagam o triplo em um carro aqui no Brasil, por que a montadora vai diminuir o preço do automóvel?”.
É a verdade capital: a montadora não vai mexer um átomo para que se um preço justo se materialize no Brasil.
A montadora, a fabricante de tênis, o fast-food do palhaço de isopor, a indústria que coloca maçãzinha no computador... Nenhum deles e nem os seus pares diminuirão o preço.
Seria a solução colocar o resultado de nossa culpa nos impostos e somente isso? Caso a gente não se mexa, o resultado será sempre a exceção.
A nossa elite tem os olhos todos voltados para fora. A nossa elite foi criada no Estado. Povo domado é aquele que deseja. E quem deseja, fatalmente irá comprar.
Eis o motivo!
Deixar de comprar um carro não se pode. Nem por desejo, pois o útil também existe! Mas, ao invés de um carro zero, o usadinho. E de usado em usado, a gente esquece o tênis gringo, o biguiméqui, os phones e tal. Aí, ou a coisa desce o preço, ou a coisa cai pra sempre.
Solução inteligente? Não existe, assim, na marra. Brasileiro paga caro para acordar, para viver, e após a morte. Deixa herança repleta de dividendos.
O camarada foi viver na França e soltou uma frase que me tocou o patriotismo: “viver no Brasil só é bom quando se é rico”.
Aos poucos comecei a guturar o hino da minha burrice, desfraldei a bandeira da ignorância, fiquei em pose de militar derrotado e gritei, emocionado:
“Que desgraça é ser bras...”.