O MORADOR DE RUA E A BICICLETA.
Um morador de rua dorme em plena calçada de uma importante rua do Bairro da Boa viagem – Recife-PE. Até aí nada de novo, pois o que não faltam nas ruas da grandes cidades é gente dormindo nas ruas. Contudo esse “dorminhoco” que não sei do seu nome mexeu comigo sem mesmo saber que eu existo. Da mesma forma que eu continuo sem saber se ele existe, pois nem ele sabe do meu nome, muito menos eu o dele. Tudo que sei é que aquele ser dormia em plena calçada em plenas oito horas da manhã. Mesmo assim até aí nada de novo. Como disse, era mais um morador de rua que dormia o seu sagrado sono. Contudo, algo me despertou a curiosidade: ele estava todo envolto em seu cobertor – aquele bem baratinho que aqui no interior de Pernambuco se costuma chamar de “ajunta pulga”... O detalhe que me chamou atenção foi uma bicicleta junto dele! Uma parte do cobertor lhe cobria, mas outra cobria uma parte da bicicleta. Dava-nos a impressão que ele teria colocado uma corrente por entre uma das rodas e presa a um dos seus pés. Não pude comprovar isto porque o cobertor, como disse, cobria parte da roda dianteira, onde possivelmente estivesse a corrente.
Saí no carro pensando nos nossos valores humanos. Que significados não teriam para aquele morador de rua a sua bicicleta? Quanta gente não reclama de uma caro semi-novo porque gostaria de estar num carro zero com ar e tudo mais? Quantas outras não choram porque mesmo tendo um carro completo almejariam uma Mercedes Benz arrojada? Quantas outras lutam apenas por uma moto ou mesmo por uma carroça de burro? Aquele morador de rua estava feliz com sua bicicleta! Foi esta a minha leitura, tamanho foi o seu cuidado para que sua bicicleta não fosse roubada. Mas afinal, aonde iria aquele habitante das avenidas com sua bicicleta? Se não tem endereço certo, será que se muda para dormir em calçada pra bairros mais distantes e por isto utiliza sua bicicleta? Difícil obter respostas, mas a gente fica feliz pelas possibilidades que aquele homem tem de ser livre além de nós. Que sonhos o levam em sua simplória bicicleta? Que desilusões lhe abrigam ao relento do sol, da chuva e do sereno? Que amores deve ele buscar no trajeto complicado da disputa desleal pelos espaços urbanos por entre carros, motos, ônibus, vans, etc.? Será que ele precisa bater o ponto em algum emprego e, temeroso de perder a hora comprou sua bicicleta? Ou será que ele vive pela ilusão que ser livre deixa via selim de sua bicicleta? Quiçá procure um amor perdido por entre sol, chuva e sereno das nossas despudoradas avenidas cheias de lixos humanos que desfilam em seus carrões acreditando que são civilizados... Ou não?