Fome de Festim
Dei um tiro na barriga pra matar a fome. Contei com os homens de lá, mas eles ficaram reacionários de repente: aí o tipo estaciona... (embora os houvesse avisado). Ninguém está tão solitário que não possa ter para quem remeter um desespero.
Ana Carolina de Braga Souza. Decidi que este seria o nome dela, Ana Carolina de Braga Souza: Braga por parte do ilustre, Souza pela impessoalidade com Z. Poderia ser Sousa, poderia ser Santos, poderia nem ser Ana Carolina: bonita que dói, óbvio; e como é morena nos cabelos! Lisos, tão lisos que não se enrolam nem na imaginação do negativista. E o sorriso? Pra que tanta tremedeira em minhas pernas? – coisa do coração derruba o homem. O de cá, não os de lá. Ana Carolina de Braga Souza... Será mãe dos meus meninos, será tutora do meu descaminho, por ela me perco... Ana C. B. Souza, assim está na lista telefônica.
E se ela nem for Braga, mas sim, Bueno, Batista ou Belmonte? Pode não ser morena nem ter cabelos lisos, talvez nem solteira seja. Mas quem mandou essa moça ter-se em nome justamente na página aleatória do meu dia de solidão?
Ai, que fome...!
As listas telefônicas perderam a personalidade. Cadê que eu encontro um tele-amizade? Em qualquer situação ideal, seria só dormir nas abas do vizinho. Hoje em dia preciso ter saudade para conversar com alguém: deito a cabeça, desligo a vida, vasculho os escombros de mim e lá encontro: um amigo, uma prima, uns desafetos, a professora. Lá existe bastante gente, e às vezes é como se eu voltasse a ter vivência: rolam até uns embates perdidos.
Não é um dia para ser coitado: nem vem ao caso. Por ventura, esteja você pensando nisso, cabe a você entender que a fome não é culpa da boca. Há um papo de prateleiras antes. Ser desertor do orfanato e ainda não ter em quem colocar a culpa é próprio de um mau lamentador. Os bons geralmente entram pra política. Ceder a face não é nada, quero ver quem empresta o murro!
Tudo bem, sigo aqui então... Um Sousa qualquer. Apenas isso. Espero ver nos homens da fé o mesmo empenho com a carência de si. Espero ver nos homens sem fé o mesmo sentimento que trazem as mães nas pontas dos dedos.
E vou sentir saudade do que terei: Ana Carolina de Braga Souza.
Será apenas colocar o Z e o nobre da gente servirá de reverência à alegria de um homem (daqui) que pode caminhar de mãos dadas com a senhora dos seus sonhos. Sonhar será preciso, antes de tudo, e viver não será tanto.
Às vezes, disfarçamos a fome com festim.