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Sempre ouvi dizerem que a vida começa aos quarenta anos. Da mesma forma eu sempre escutei que a idade que temos é a que sentimos. De repente, ROBERTO CARLOS passa dos quarenta, chega aos setenta anos, mas com o sentimento talvez de trinta. Detalhes tão pequenos de nós dois, deve o rei dizer no ouvido de muita gente ainda hoje. Eu daria minha vida para te esquecer, certamente deve dizer diante de si mesmo ante um amor não correspondido. “Como é grande o meu amor por você”, certamente esta frase musical acalenta suas declarações de amor. Amor em seus vários sentidos e matizes, pois a vida do REI é uma ode ao amor. Amor a natureza quando exalta as baleias; amor a Deus invocado em “JESUS CRISTO”; amor a vida familiar, quando almeja as férias escolares, pois “quando as crianças saírem de férias, talvez a gente possa então se amar um pouco mais”; amor com café configurado nos gestos simples que sustentam o afeto como a promessa de que “amanhã de manhã, vou fazer um café pra nós dois, te fazer um carinho e depois me envolver em teus braços”; amor a família, pois Roberto era quase um devoto de Dona Laura, a Lady Laura; amor traduzido na saudade da titia Amélia que “há quanto tempo a gente nem se vê”... Neste tear do amor que recheia toda a trajetória de Roberto, quase tudo certamente foi por ele retratado em suas canções. Quem duvida que “nas curvas das estradas de Santos” não há mistura de afeto movida pelo ímpeto da juventude? Quem não sente como ele a solidão das “flores do jardim da nossa casa”? Quem um dia, chegando de viagem, abrindo o portão de casa não se  lembra de  “um cachorro me sorriu latindo”?

Roberto, diante da simplicidade de suas letras, nunca foi bem aceito pela crítica especializada. Como quem sempre soube o que faz, nunca perdeu tempo com fofocas nem “Candinha”. Muito menos se envolveu com política partidária. Verde e Amarelo é uma canção ao Brasil, digo, de amor ao Brasil, como assim (de amor) é toda sua obra poético-musical. “Não preciso nem dizer tudo isto que lhe digo”... O Rei não se diz, mas se canta. Um canto sem preconceito com ninguém. Um canto a mulher gordinha, a mulher pequena, a mulher que usa óculos, a mulher de quarenta.

“Da janela o horizonte
A liberdade de uma estrada eu posso ver
O meu pensamento voa livre em sonhos
Pra longe de onde estou

Eu às vezes penso até onde essa estrada
Pode levar alguém
Tanta gente já se arrependeu e eu
Eu vou pensar, eu vou pensar” (...)

 

Talvez se não conduzisse dentro de si o viés da liberdade que “voa livre em sonhos”, Roberto não tivesse” tanto substrato para retratar o citidiano das pessoas com simplicidade e sentimento. “Eu tenho tanto pra lhe falar, mas com palavras não sei dizer, como é grande o meu amor por você”. “Eu disse adeus, nem mesmo eu acreditei, mas disse adeus. E vi cair no chão todos os sonhos meus”...

Hoje, aos setenta anos, a vida lhe subtrai sua filha, pouco tempo depois da “partida” de sua mãe a Lady Laura. A vida é assim: a arte encena o que a vida ensina e isto ele aprendeu muito bem no trajeto vitorioso de sua carreira. Como é um homem de fé, “todas as nossas senhoras” devem estar lhe acalentando o espírito. Como é vocacionado para o amor “Eu sei! Quanta tristeza eu tive. Mas mesmo assim se vive, morrendo aos poucos por amor
Eu sei! O coração perdôa, mas não esquece à tôa e eu não me esqueci”... Contudo, o destino das estrelas é no céu. Um dia Roberto vai ter que “viajar”, pois este é o nosso destino. Assim foi com Luiz Gonzaga, com Piaf, com Nat King Cole, com Nelson Gonçalves, com Jacson do Pandeiro, com Pixinguinha, Cartola, Orlando Silva, Dalva de Oliveira, Chiquinha Gonzaga e tantos outros. Fazer o quê? “Não adianta nem tentar lhe esquecer, durante muito tempo em nossas vidas você vai viver”...

Acho mesmo que a vida começa aos setenta. Vê se-tenta. Afinal, 80 é uma velocidade ideal. Numa coisa concordamos também: a idade que a gente tem é a que a gente sente. O diferencial está no que se sente, pois se este sentir se fundamenta no amor, então é só partir pro abraço.

Parabéns meu Rei.