MÃES de REALENGO

 

1º ATO:

Vem aí o dia das mães. Vem aí a angustia anunciada:  filhos que amam as mães a fazerem o possível e o impossível pra comprar um bom presente; filhos ausentes preocupados pela suposta obrigação que sentem em fazer uma visita a mãe em seu dia; filhos que não conheceram as mães mas sabem que elas estão vivas e  tudo fariam para nesse dia abraçar, beijar e, quiçá, dar um presente; filhos preocupados na compra de um presente, mas desempregados, sofrem com a pressão comercial em cima do presente; filhos ricos, mas que só aparecem nesse dia e de mãos vazias, talvez imitando o coração; filhos que vão a missa ou ao culto darem de presente às suas mães uma religação com Deus; filhos cujas mães estão encarceradas, em nosocômios, em lugares incertos e não sabidos, nos baixos meretrícios. Filhos que não precisam de presentes para dar às suas mães, tampouco de dia específico para visitas. Filhos que se dão de presente o ano todo, como deveriam fazer todos os filhos. Filhos para quem uma prece, um abraço, um sorriso, um afago, uma flor colhida no trajeto de casa, têm valor inestimáveis enquanto presentes para suas mães. São esses os filhos cujas mães são inexpressivas. Explico: inexpressivas são aquelas mães que tudo nos deram no tempo e na hora certos, inclusive limites. Limites para respeitas o próximo, os mais velhos, os diferentes. Limites para entender que o direito de um termina quando o do outro começa. Inexpressivas porque nos deram as lições todas que um dia a vida nos tomaria como tarefa de rua, diferente do nosso dever de casa dos tempos de escola. Mães inexpressivas são aquelas que a gente não precisa mais delas pelo simples fato de elas serem nós e através dos filhos se repetirem nas atitudes... Dito diferente, elas são expressivas dentro de nós, pois à distância ficam zelando por nós em oração.

Neste tear de razão e emoção, não me sobra alternativa senão a de tocar no assunto de Realengo:

2º ATO

Os meninos se foram e elas ficaram sem ter pra quem construir expressividade. Imagino só que nesse dia das mães quão não fiquem meio “peixe fora d’água” talvez até com outros filhos por perto. Só que sina de mãe é ser inteira – elas não funcionam pela metade. Na falta de um filho, mesmo que tenha dez, ela se desestrutura toda. Talvez eu não tenha muito alcance das mães naquilo em que Cazuza sempre dizia: “só elas são felizes”. Algo de mistério tipo Santíssima Trindade? Algo de eterno, de terno, de sol e chuva, de noite e dia, de choro e alegria? Talvez não! Os mistérios todos das mães estão contidos entre umas e outras coisas, posto que a sabedoria por assim ser não se situa no óbvio, mas naquilo que só a imaginação alcança e só a grandeza de Deus pode facultar essa ventura.

Peçamos todos ao Senhor Jesus para que dê o conforto a todas elas, posto que esquecer os filhos será impossível; peçamos outrossim, muita iluminação em nossos caminhos no sentido de que tanta violência se perca nos despenhadeiros e que seus arautos abrandem os corações e se rendam a civilização do amor e do perdão. Peçamos, finalmente, que as doze mães desses garotos se recomponham no amor para que o desespero não as faça perder a fé em Deus e nos homens de boa vontade.