A CHEGADA DOS MENINOS de Realengo no céu.
De repente São Pedro pediu a Jesus para abrir uma escola especial no céu. Jesus permitiu, mas perguntou a Pedro qual a razão disto, considerando que quem vai pro céu já não necessita de escola. Pedro simplesmente disse a Jesus que as crianças que colocaria nessa escola especial, seriam aquela que foram vitimas de um impiedoso matador que, em Realengo – subúrbio do Rio de Janeiro foram mortas em plena escola. Convenceu a Jesus acerca desse acolhimento especial, considerando que a vida na terra talvez ainda permanecesse no inconsciente daquelas crianças. Jesus entendeu e disse a Pedro: “certamente que tens razão. Satanás incorporou no corpo daquele matador deixando as crianças mortas sem tempo de compreender o que acontecera. Certamente a passagem delas para o céu não deve estar muito clara e tu terás a responsabilidade de acalmar o espírito de todas elas. Não te assuste, Pedro, se as crianças quiserem conversar com seus pais na terra. Mas vai. Abre a escola e acolhe a todas”...
Pedro teve todo o cuidado de preparar a sala de aula igualzinha às da terra. No primeiro momento, um clima de confusão mental se instalou nas crianças. Todas pareciam meio zonzas, com olhares perdidos pelo teto que não era teto, mas nuvens parecidas com o céu. Pedro percebeu logo que elas estavam meio que acordando de um sonho, como sem saber que haviam morrido. Num raio de sol por entre as nuvens, São Pedro aparece e põe as mãos nas cabeças de todos. Eram doze crianças – doze novos anjos que o céu acolhia em sua imensa tri dimensão. Em pouco tempo um novo ambiente se instalava, graças ao poder de Pedro, conferido por Jesus, para acolher aqueles novos habitantes do céu. Inesperadamente, Pedro escutou as crianças falando consigo mesmas. Deixou que elas prosseguissem e pôs-se a escutar.
A criança nº 1 conversava com sua mãezinha:
“Mamãe, quando o homem entrou na sala eu fiz de tudo para não ser alvejado. Deitei no chão, mas a bala foi mais veloz do que eu. Fica calma. Acalma o papai. Eu estou bem. Um beijo no meu irmão. Fiquem em paz”.
A criança nº 2 conversava com seu irmãozinho:
“Mano, não chore por mim. Não deixe de estudar porque isto aconteceu em nossa escola. Só o estudo poderá dar a você maiores condições de ajudar nossa mãe. Ela precisa deixar de ser doméstica, pois tá cansada e a idade chegando. Não deixe de estudar, repito.”
A criança nº 3, inconsolada ainda, falava baixinho:
“Papai do céu, onde estou? Cadê minha mãe e meu pai? O que houve na minha escola? Vem me buscar mamãe que o recreio já terminou, a aula terminou, mas você não veio me buscar!”
A criança nº 4 consolava o pai:
“Pai, eu sei que você está sofrendo. Nós dois, desde que mamãe morreu nos segurávamos um no outro. Mas agora que o destino me separou de ti, peço a papai do céu pra te dar uma pessoa que te faça companhia. Arrume outra mulher, papai, case-se e tenha mais filhos. Daqui eu fico te abençoando”...
A criança nº 5 cantarolava uma cantiga de ninar:
“se essa rua, se essa rua fosse minha, eu mandava, eu mandava ladrilhar. Com pedrinha, com pedrinha de brilhante, para o meu, para o meu papai passar”...
A criança nº 6 rezava baixinho:
“papai do céu, dai consolo aos meus pais. Dai saúde a meu irmãozinho que é doentinho e fazei com que ele nunca desista de lutar. Não deixeis papai do céu, que ele abandone a escola. Fazei com que ele seja sempre obediente e ajude a mamãe lavar a louça”...
A criança nº 7 falava bem alto à professora:
“Não fique triste, tia. Você sempre foi forte e sempre se dedicou a todos nós. Eu sei que às vezes você quer deixar a escola porque o salário é baixo e porque alguns alunos não colaboram. Mas como você sempre dizia, não basta ser professora, mas mestra como você. Não fique triste. Outros alunos lhe esperam. Um dia, tia, quem sabe esse país não muda e elege a educação como prioridade? Do jeito que você faz sua parte tão bem, a gente fica daqui de cima torcendo por você e por tantos outros iguais. Não chore. Eu sempre me lembro dos seus conselhos, mesmo daqui deste lugar lindo onde não há violência, só amor.”
A criança nº 8 sussurrava baixinho meio confusa:
“Papai? Mamãe? Cadê vocês? Julinho? Cadê meu irmão que não responde! Ah, agora eu sei: será que eles ficaram tristes porque eu viajei sem lhes avisar? Mas que lugar é este? Eu preciso saber para ligar do celular para meus pais e meu irmão”...
A criança nº 9 abriu uma porta lateral da escola e:
“Lá vai o Igor! Mas pra onde ele vai se não deve ter campo de futebol por aqui? Igor? Volta! Vem colher flores comigo. Quem sabe a gente não improvisa uma bola de futebol de rosas perfumadas? Não, não é Igor, enganei-me! É um anjo que passeia pela relva colhendo as folhas secas! Este lugar parece um céu. Mas o que eu faço aqui no céu. Painho? Mainha? Venham me buscar”! Aqui é tudo lindo, mas sem vocês está nublado, venham ao menos me ver”!
A criança nº 10 ficou sentada o tempo todo escrevendo:
“Papai do céu, onde está você neste céu? Por que você não vem me dizer a razão daquele homem com revólver na mão ter nos tirado dos nossos pais? Por que você, papai do céu, não acaba com as armas de fogo do Brasil? Por que lá, papai do céu, só quem vai pra cadeia é preto e pobre? Quero lhe ver. São Pedro até agora só nos escuta e pouco fala, mas eu preciso saber o porquê daquele matador ter feito isto conosco. Não me escuta? Tá bem. Eu vou lhe esperar. Enquanto não vens, ilumina meus pais, meus irmãos e meus professores, mas venha logo que eu quero lhe ver”...
A criança nº 11 cantarolava baixinho:
“Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz. Onde houver ódio que eu leve o amor... Pois é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado e é morrendo que se vive para a vida eterna”... De repente ela se levanta e diz: vida eterna? Céus, esta é a vida eterna! Mas ontem eu não estava aqui. Onde estão meus pais e minha professora?
A criança nº 12 ora em voz alta:
“Senhor, perdoai aquele matador. Tende piedade de sua alma cansada e tão cheia de ódio contido, preconceito e solidão. Fazei, Senhor Jesus, que ele se arrependa de tudo que fez. Dai-lhe o consolo e a paciência para renovação espiritual onde quer que ele esteja. Da mesma forma eu peço também muita luz para os bons policiais. Para aquele em especial que ajudou evitando que mais crianças morressem como nós. Mas dai, Senhor Jesus, o consolo aos meus pais, amigos e professores. Eles precisam seguir vivendo e criando meus outros irmãos. Um dia a gente certamente vai se encontrar na bem aventurança do Pai Eterno. Nesse dia, tudo se converterá no amor. As armas ficarão no passado do atraso de vidas passadas, até um dia, até talvez, até... Quem sabe?
Bem crianças, chegou a hora de irmos jantar. Quem vai fazer a oração é o senhor Jesus. Ele vai conhecer todas vocês pessoalmente. Depois do jantar, a gente vai conhecer os jardins do céu. Vou apresentar nossos irmãos trabalhadores do bem e cuidadores da nossa harmonia interior. No decorrer do passeio, a gente vai orientando sobre a dormida de vocês e a rotina do céu. Aqui não há relógio nem horário como na terra. A gente se comunica prioritariamente com o pensamento. O perfume das flores é uma das nossas formas de comunicação. As águas das cachoeiras são como um canção a nos ensinar compreender melhor os momentos nebulosos que por acaso ocorram. Mas não existe aqui no céu a concorrência da terra. Da terra, aqui, só o sal e a luz, conforme pregara Jesus nas suas paragens por lá, quando dizia: "vós sois o sal da terra e a luz do mundo".