Agora é tarde...
 
Não nego: recuso-me terminantemente a publicar os meus livros a minha custa. Pode ser bobagem, mas não consigo me ver com eles debaixo do braço tentando vendê-los. Acontece muito por aqui e acho deprimente. Escrever pode ser uma atividade do coração, mas também é uma profissão. E comprar e ler o livro tem que ser uma decisão do leitor. Um momento iluminado em que o menos importante é o dinheiro gasto na compra. Pois foi o que aconteceu: ele me pegou no pulo e já foi logo dizendo: você não comprou meu livro. E nem vou comprar, pensei, mas não disse. E nem teria tempo de dizer por que ele logo foi tirando o livro da pasta, escrevendo a dedicatória e colocando em minhas mãos. O jeito foi pegar e pagar E guardar o livro em uma esquecida gaveta. Algum tempo depois o livro veio parar em minhas mãos, mexendo que estava em coisas olvidáveis. Folheei e nem mesmo reli a dedicatória. Arranquei a página manuscrita com delicadeza para não deixar marcas e a piquei em pedacinhos. Sem reler. O livro,  coloquei em local de fácil acesso para que alguém pudesse aproveitar.Hoje, no rádio, ouço a notícia. Ele morreu sem saber que o livro não foi lido por mim. Mas agora é tarde, Inês é morta.