A CARIDADE

“Se eu gastasse todos os meus bens para o sustento dos pobres, se entregasse o meu corpo às chamas, mas não tivesse caridade, isso de nada me serviria” (CARTA DE S. PAULO AOS CORINTIOS).

Entender o significado exato dessa palavra símbolo do cristianismo, não é uma tarefa fácil. Não se trata simplesmente em distribuir bens aos menos favorecidos. Na verdade, constitui um exercício de humildade e sabedoria muito complexo. O intuito desse modesto escrito foi o de mostrar através de um testemunho, que o apóstolo dos gentios estava com a razão. O “causo” que vamos relatar é um exemplo da vida prática que caracteriza aquilo que a caridade não é.

Joaquim dos Santos, vulgarmente conhecido com “Quincas” era um indivíduo de baixa estatura, moreno, que na ocasião de nossa história estava com 32 anos de idade. Casado, pai de 5 filhos, sendo mais novo de colo e o mais velho tinha mais ou menos 10 anos. Tinha vindo da zona rural e como tinha habilitação para dirigir veículos, não foi difícil arrumar um emprego em uma frota de táxi. Foi designado para estação rodoviária da cidade. O salário era magro e para conseguir fechar o orçamento doméstico, sua esposa teve que ajudar nas despesas domésticas, fazendo unhas das vizinhas e conhecidas do lugar. Apesar das dificuldades, conseguia dar a sua família uma vida digna, vivendo em paz e harmonia.

Quincas gostava de prosear com os seus passageiros. Geralmente, ficava sabendo particularidades deles, e também falava de si, enquanto conduzia as pessoas a seu destino. Na ocasião, Uberaba-MG era muito visitada por pessoas do país inteiro que procurava o Médium Chico Xavier em busca de conforto, principalmente pelas mensagens mediúnicas desse famoso espírita mineiro. No dia que antecedia a sessão espírita, a rodoviária aumentava o volume de pessoas que chegavam a cidade. Em um desses dias, Quincas recebeu em seu táxi, uma senhora idosa bastante simpática e bem disposta. Atendia pelo nome de Rita. Logo, o nosso taxista ficou sabendo que a digníssima senhora tinha perdido um filho de acidente automobilístico e o motivo de sua vinda a Uberaba era para ver se conseguia estabelecer contato com o rapaz.

Como ela vinha todos os meses e sempre Quincas estava no ponto da rodoviária, Dona Rita habituou-se a ser conduzida por ele. Aos poucos, estabeleceu-se entre os dois uma forte amizade. A carência afetiva da velhinha foi o motivo principal para essa aproximação. Numa dessas vindas a Uberaba ele a convidou a visitar sua casa. De imediato ela percebeu a condição de pobreza da família de seu motorista. Quando voltou para o hotel deixou juntamente com o valor da corrida, uma gorjeta bem mais alta do que a habitual. Com o passar do tempo, passou a se hospedar na casa da família de Quincas e também, a conviver com os seus problemas. Todos os meses, uma generosa soma de dinheiro vindo de sua benfeitora era depositada na conta desse chofer de táxi.

Um dia ele pediu demissão do emprego. Sua esposa também parou de trabalhar “para fora”. Afinal dinheiro deixou de ser problema naquela casa. Dona Rita mandava uma quantia suficiente para sustentar sua família, sendo muito maior do que o salário de motorista de táxi e dos trocados obtidos pelo serviço de manicure. A partir daí, todas as decisões familiares eram tomadas depois de consultar sua benfeitora. Desde a escolha da escola dos filhos, passeios, festinhas de aniversários e etc.. Houve uma mudança radical no modo de vida de Quincas e de sua família. Por outro lado, Dona Rita com o passar do tempo, sentia-se muito poderosa em prestar esse tipo de ajuda adicional. Mesmo porque era ela que havia propiciado uma melhor condição de vida para aqueles desfavorecidos. Assim, mostrar a melhor conduta para aqueles desvalidos tornou-se um meio de ocupar seu tempo. Em seu ciclo de amizade, sempre que podia, relatava seus feitos. Percebia-se pelas atitudes uma indisfarçável vaidade e uma pontinha de soberba por parte dela.

Com o tempo, isto começou a acarretar problemas sérios dentro da casa de Quincas, principalmente com sua esposa. Problemas esses que culminaram com a separação do casal. Ela levou as crianças para casa de sua mãe, voltando a trabalhar de manicure. Ele, hoje vive sozinho, sem a esposa e filhos e está desempregado. Dona Rita, por sua vez, não manda mais dinheiro, pois está doente e parou de visitar Uberaba. No final, fica a questão: A ajuda de dona Rita foi benéfica, ou não? Infelizmente, a resposta é não. Muito embora, inicialmente aquela senhora fosse bem intencionada. Contudo sua ação acabou gerando um grande prejuízo para aquela família. Finalizando é bom lembrar as sábias palavras de S. Paulo: “A caridade é paciente, é benigna; não é invejosa, não é vaidosa, não se ensoberbece; não faz nada de inconveniente, não é interesseira, não se encoleriza, não guarda rancor; não se alegra com a iniquidade, mas se regozija com a verdade”.

João da Cruz
Enviado por João da Cruz em 24/01/2011
Reeditado em 24/01/2011
Código do texto: T2748715
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