Os anjos andam aos pares
Não que eu seja descrente da raça humana. Não totalmente. Mas mesmo assim quando acontece algo tão fora da realidade cotidiana eu me surpreendo. E a surpresa me deixa arrepiada. E eu sinto até vontade de chorar. E se não chego a tanto é porque sou durona. Mal deixo a névoa se apossar de minha visão.
Sim, eu me emocionei. É uma história simples que nem sei se vou conseguir repetir o acontecimento na forma do acontecido. Mas vou tentar. Porque a beleza desta história não está nas palavras que eu por ventura possa burilar para enfeitá-la. A beleza desta história está nas palavras que eu ouvi.
A chuva está dando nos nervos, nos meus e nos de minha equipe do trabalho. A nossa casa tão amada está passando por reformas e nós continuamos lá, no meio do caos. A parte frontal está cercada por tapumes e por causa da chuva tudo é precário e improvisado. Os olhos da cidade estão voltados para nós e não são olhos bons. Nossos planos para o Ciclo de Natal esbarram em dificuldades de toda monta. Não se passa um dia sem uma notícia desagradável. Pois não é que no meio de tanta confusão surge algo tão surpreendente que me fez pensar que um anjo tenha me visitado. Um não. Dois. Acho que as vezes eles andam aos pares.
Eles surgiram de um lugar onde eu não esperava que surgissem. Eram dois, um mais alto e o outro um pouco mais baixo. Um mais claro, o outro moreno, assim como eu. Perguntaram se eu me lembrava deles, já haviam me procurado uma vez e pelo que deduzi eu os ajudei em alguma coisa. Eu não me lembrava, não tive coragem de falar isso. É, as vezes eu minto. Falei que sim, claro. E perguntei em que poderia ajudá-los, outra vez.
A Praça de nossa cidade é linda. Eu sou responsável pelos eventos que acontecem nela. Todo mundo quer se apresentar ali, fazer alguma coisa, vender seu peixe. E quando os meninos disseram que pretendiam se apresentar na Praça no próximo domingo logo imaginei mais uma dupla caipira. E apesar de não ter nenhum evento marcado para domingo de manhã, fui colocando obstáculos, embora gentilmente. Não poderíamos emprestar o som que já estava agendado, nem divulgar por nosso site e coisas assim. Os meninos retrucaram pacientemente frente ao que já estavam acostumados: adultos achando que sabem tudo. Não, eles não queriam se apresentar artisticamente. Queriam apenas conversar com as pessoas. Para isso não precisavam de som, a conversa seria cara a cara. No mínimo achando tudo meio inusitado exclamei do alto da minha petulância: mas vocês dois querem conversar cara a cara com as pessoas? Eles riram e um falou: Mas nós não somos dois, somos vinte e seis. Aí é que eu não entendi mais nada. Vinte e seis meninos queriam sair pela Praça, no domingo de manhã para conversar com as pessoas. Cara a cara. Olho no olho. E então, eu fiz a pergunta chave: Mas o que vocês pretendem com isso afinal?Qual o objetivo? E ouvi a resposta: Nós só queremos fazer o mundo melhor, um pouquinho.
Amanhã eles voltarão. Eu não sei ainda o que poderei fazer. O serviço público é altamente burocrático e nem sempre podemos atender aos pedidos que nos fazem. Principalmente os de última hora. Mas seja como for, eu vou ler com eles o texto que pretendem divulgar enquanto conversam com as pessoas. Antes, terei que encontrar uma caminho para ajudá-los. Imprimir mil panfletos. Não sei ainda se a Gráfica terá condições de fazer isso para o dia seguinte. Não sei onde arrumarei o dinheiro. Mas sei que de uma forma ou de outra eu vou ajudá-los a fazer o que querem – tornar o mundo só um pouquinho melhor. Isso é investimento no futuro. Não é caridade.
Não que eu seja descrente da raça humana. Não totalmente. Mas mesmo assim quando acontece algo tão fora da realidade cotidiana eu me surpreendo. E a surpresa me deixa arrepiada. E eu sinto até vontade de chorar. E se não chego a tanto é porque sou durona. Mal deixo a névoa se apossar de minha visão.
Sim, eu me emocionei. É uma história simples que nem sei se vou conseguir repetir o acontecimento na forma do acontecido. Mas vou tentar. Porque a beleza desta história não está nas palavras que eu por ventura possa burilar para enfeitá-la. A beleza desta história está nas palavras que eu ouvi.
A chuva está dando nos nervos, nos meus e nos de minha equipe do trabalho. A nossa casa tão amada está passando por reformas e nós continuamos lá, no meio do caos. A parte frontal está cercada por tapumes e por causa da chuva tudo é precário e improvisado. Os olhos da cidade estão voltados para nós e não são olhos bons. Nossos planos para o Ciclo de Natal esbarram em dificuldades de toda monta. Não se passa um dia sem uma notícia desagradável. Pois não é que no meio de tanta confusão surge algo tão surpreendente que me fez pensar que um anjo tenha me visitado. Um não. Dois. Acho que as vezes eles andam aos pares.
Eles surgiram de um lugar onde eu não esperava que surgissem. Eram dois, um mais alto e o outro um pouco mais baixo. Um mais claro, o outro moreno, assim como eu. Perguntaram se eu me lembrava deles, já haviam me procurado uma vez e pelo que deduzi eu os ajudei em alguma coisa. Eu não me lembrava, não tive coragem de falar isso. É, as vezes eu minto. Falei que sim, claro. E perguntei em que poderia ajudá-los, outra vez.
A Praça de nossa cidade é linda. Eu sou responsável pelos eventos que acontecem nela. Todo mundo quer se apresentar ali, fazer alguma coisa, vender seu peixe. E quando os meninos disseram que pretendiam se apresentar na Praça no próximo domingo logo imaginei mais uma dupla caipira. E apesar de não ter nenhum evento marcado para domingo de manhã, fui colocando obstáculos, embora gentilmente. Não poderíamos emprestar o som que já estava agendado, nem divulgar por nosso site e coisas assim. Os meninos retrucaram pacientemente frente ao que já estavam acostumados: adultos achando que sabem tudo. Não, eles não queriam se apresentar artisticamente. Queriam apenas conversar com as pessoas. Para isso não precisavam de som, a conversa seria cara a cara. No mínimo achando tudo meio inusitado exclamei do alto da minha petulância: mas vocês dois querem conversar cara a cara com as pessoas? Eles riram e um falou: Mas nós não somos dois, somos vinte e seis. Aí é que eu não entendi mais nada. Vinte e seis meninos queriam sair pela Praça, no domingo de manhã para conversar com as pessoas. Cara a cara. Olho no olho. E então, eu fiz a pergunta chave: Mas o que vocês pretendem com isso afinal?Qual o objetivo? E ouvi a resposta: Nós só queremos fazer o mundo melhor, um pouquinho.
Amanhã eles voltarão. Eu não sei ainda o que poderei fazer. O serviço público é altamente burocrático e nem sempre podemos atender aos pedidos que nos fazem. Principalmente os de última hora. Mas seja como for, eu vou ler com eles o texto que pretendem divulgar enquanto conversam com as pessoas. Antes, terei que encontrar uma caminho para ajudá-los. Imprimir mil panfletos. Não sei ainda se a Gráfica terá condições de fazer isso para o dia seguinte. Não sei onde arrumarei o dinheiro. Mas sei que de uma forma ou de outra eu vou ajudá-los a fazer o que querem – tornar o mundo só um pouquinho melhor. Isso é investimento no futuro. Não é caridade.