Cemitério do Peixe
 
 
Notícias de jornal são altamente inspiradoras. Que o diga Pedro Almodóvar. Foram três notícias lidas por ele que o inspiraram a escrever o premiado Fale com Ela que inclusive ganhou o Oscar de melhor roteiro original. As notícias, que muitos de nós também lemos e não inspiraram nada, foram as seguintes: Nos EUA uma jovem desperta de um coma depois de seis anos; na Romênia, o coveiro viola o cadáver de uma jovem que estava esperando o sepultamento. Como a jovem não estava morta, apenas cataléptica, acabou acordando e livrou-se de ser enterrada viva. E finalmente, também nos EUA, uma mulher em coma apareceu grávida.

Notícias de jornais também inspiraram a mim e quem me dera que fosse com tanto brilho e sucesso. Mas tenho alguns textos que escrevi no calor da emoção da notícia. Assim foi quando descobri as Noivas do Cordeiro, A quarta mulher e Ipoema e a Festa das Bruxas, publicadas aqui como artigos. O primeiro, inclusive rendeu 2245 leituras e alguns desaforos enviados sob a forma de comentários ou e-mails.

E agora um novo artigo chamou a minha atenção. Foi publicado neste domingo, no Estado de Minas, o artigo A Sentinela da Tradição, escrito por Pedro Ferreira e que conta a história do lugarejo conhecido como Cemitério do Peixe e de L, que viria a ser sua Sentinela. E eu não vou resistir. Vou contar uns pedacinhos da história do meu jeito pedindo permissão ao Pedro. O artigo completo é muito bonito, mas não sei se poderá ser lido também na net. Vou averiguar e se conseguir alguma informação, repasso porque vale à pena ler a historia inteirinha.

Cemitério dos Peixes é um lugarejo que possui 200 casas de chão batido e pintadas com caiação branca. Tem também uma Igreja e um cemitério. E as casinhas são tão baixas que um homem muito alto poderá olhar por cima dos telhados. (Isso é claro é invenção minha). Dessas 200 casas só uma é ocupada. Uma mulher mora ali, sozinha, mas nem tão sozinha assim. Ela tem oito cães.

Imaginem uma caminhada solitária por essa cidade. Certamente pensaríamos que estávamos em uma cidade fantasma. Não ouviríamos o barulho de carros nem de crianças brincando, indo ou vindo da Escola. Mas ouviríamos a quietude da natureza e seus barulhos, que são música pura.  A menos que nos aproximássemos da Casa de L, . Então, poderíamos ouvir barulhos civilizados se a TV estivesse ligada. Porque L tem uma televisão e uma antena parabólica. Ou então o alarme natural dos cães.

Depois que li a reportagem eu fiquei imaginando L andando pelas ruas nas noites de lua cheia, como ela conta que faz, seguida pelos oito cães.  É nessas noites que ela cuida dos jasmins (sinta o cheiro, sinta), das roseiras que dão rosas brancas e vermelhas e outras flores. Fiquei imaginando flores que ela não citou mas que eu plantaria. Flores do campo, margaridas e brincos de princesa. Girassóis. Copos de leite nos brejos do rio.  Senti uma vontade louca de contar uma história baseada nessa, com um lugarejo onde mora uma mulher sozinha, mas não morta. Uma mulher cheia de vida, apenas com a vida pausada. Mas na casa dessa mulher que eu inventaria não faltariam livros, nem discos, nem DVDs com bons filmes. E essa mulher teria um segredo inconfessável.

Não sei se eu, MO, daria conta de viver em um lugar assim, com pouca gente e muito bicho. Pássaros de tudo quanto é jeito, tatus, gambás, capivaras, onças e até um lobo guará rondam o vilarejo e o quintal de L. Mas em minha fantasia, a mulher que eu gostaria de ser viveria tranquilamente.

Mas qual seria a história desse lugar? Nada comprovado, só história oral. Há uns duzentos anos atrás um destacamento de polícia foi montado para impedir o contrabando de pedras preciosas extraídas na região de Diamantina. Um dia faltou alimento e os soldados acabaram comendo peixe estragado e pescado no rio que banha o lugar, o que levou todos a morte. Outras versões dão conta que pessoas chamadas Peixe foram ali enterradas, um padre que por ali passava a caminho da cidade e um escravo, mas na verdade nada é comprovado.

O que existe é que esse vilarejo pertence a Conceição do Mato Dentro, cuja Prefeitura é responsável pela manutenção das casinhas brancas que só são utilizadas na segunda quinzena de agosto quando se comemora o Jubileu de São Miguel Arcanjo e Almas. É quando a  vila multiplica a sua população umas dez mil vezes. E será em um desses Jubileus que ela chegará, a pessoa que vai fazer a minha história andar...