TEXTO A-FINADO.

 

Agora, enquanto os mortos são chafurdados no dia que dizem ser seu, acho estranho. Mortos não têm dia, mas eternidade. Nós, viventes, caminheiros desta saga que a espiritualidade nos concede, sempre inventamos justificativas para as nossas limitações de compreensão. Os mortos, se de fato nos forem queridos, não morrem. Os ossos deles têm outra significação, porque o mais lindo do humano é o que sai do coração; o que sai do coração não sucumbe, ramifica-se em correntes de amor, se houver amor. Não havendo, instala-se sem alarde e firma-se a esperança do bem.

Hoje, quando muitos se deslocam aos cemitérios, prefiro ficar sozinho com meus conflitos vivos. Para os sonhos matados ou morridos, retiro flores na imaginação para colocar na tumba, na lápide deles que um dia nunca foram realidade. Sonhos legítimos são aqueles que, conosco, viram verdade em nós. Com eles, a gente segue em frente; sem eles, a gente busca novos para ser feliz, posto que do viver sem sonhos, só nos resta o cansaço e a solidão.

Prefiro, hoje, reconhecer o  mérito das flores para o meu mote: Flores, oh flores, como sois lindas e fortes! Sede, pois o meu refúgio em vida como sereis na minha morte!

Lá fora, o sino toca. Aqui dentro eu me toco. Lá fora, as flores seguem aos jazigos. Aqui dentro, deixo flores nos túmulos dos amores mortos; dos rancores sepultos, das fantasias matadas antes mesmo de nascerem.