FLORBELA ESPANCA
Todos nós, especialmente do Recanto das Letras a conhecemos. Quem nunca leu Florbela Espanca? Eu, especialmente, me identifico demais com seus poemas. Talvez porque tenha uma veia melancólica, talvez porque sempre fui uma mulher à frente do meu tempo. Hoje me dedico mais as crônicas, mas já escrevi muitas poesias e quase todas elas têm uma grande carga de dor, de tristeza, de melancolia. Por isso sou apaixonada por sua obra. O que vou colocar aqui e agora, não deve ser novidade para ninguém. É mais uma homenagem à essa excepcional escritora da língua portuguesa.
Livro de Mágoas (ou Livro das Mágoas) é a primeira obra poética de Florbela Espanca, editada em 1919 em Lisboa, graças a Raul Proença, um crítico literário que reconheceu o talento da jovem poetisa.São trinta e dois sonetos dedicados ao pai e ao irmão. Ao longo da obra Florbela destaca a mágoa, a dor, a saudade e uma tendência para chorar e lamentar-se. Assim Florbela estabelece uma comunicação entre os tristes e magoados. A poetisa expõe esta intenção logo no primeiro soneto: "Este Livro…"
"Este livro é de mágoas
Desgraçados
Que no mundo passais.
Chorai ao lê-lo!
Somente a vossa dor de torturados."
A poesia de Florbela expressa a paixão que ela nutria por si mesma e a dor de não ser reconhecida em sua grandeza. Qualquer ser humano que conhece Florbela já se identificou, em algum momento, com alguma citação.
"Quem me dera encontrar o verso puro,
o verso altivo e forte, estranho e duro,
que dissesse a chorar isto que sinto!"
Sua poesia recorre sempre a temas de solidão, desencanto, mas sempre com ternura e desejo, refletindo sua melancolia pessoal, numa linguagem passional e sensual.
"No divino impudor da mocidade,
Nesse êxtase pagão, que vence a sorte,
Num frêmito vibrante de ansiedade
Dou-te meu corpo prometido à morte"
Nascida em Vila Viçosa (Alentejo), em 1895, Florbela de Alma da Conceição Espanca teve sua atormentada vida encurtada pelo suicídio. Em 1930, a poetiza descobre que sofre de edema pulmonar, e então, ingere dois frascos de Veronal, causando sua morte, no dia em que completaria 36 anos.
“E se um dia hei de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que saiba me perder… pra me encontrar…”
Apesar do seu talento invulgar e da qualidade do que escreveu, a poetisa inclui-se no numeroso contingente de escritoras que, em vida, não tiveram o valor de sua obra reconhecido pela crítica e pelo público.
Com efeito, as mulheres e homens do seu tempo não estavam preparados para as suas poesias erótico-amorosas. Numa época de extremado fingimento sobre o sexo, a poetisa teve a audácia de os exteriorizar, com desinibida franqueza. A hipocrisia do puritanismo burguês, não poderia tolerar a liberdade de expressão e as vivências íntimas feitas por ela. Porém, a poesia de Florbela significou a abertura dos caminhos para a poesia erótica feminina na literatura portuguesa. À MEMÓRIA DE FLORBELA ESPANCA
Dorme, dorme, alma sonhadora,
Irmã gémea da minha!
Tua alma, assim como a minha,
Rasgando as nuvens pairava
Por cima dos outros,
À procura de mundos novos,
Mais belos, mais perfeitos, mais felizes.
Criatura estranha, espírito irrequieto,
Cheio de ansiedade,
Assim como eu criavas mundos novos,
Lindos como os teus sonhos,
E vivias neles, vivias sonhando como eu.
Dorme, dorme, alma sonhadora,
Irmã gémea da minha!
Já que em vida não tinhas descanso,
Se existe a paz na sepultura:
A paz seja contigo!
(Poema de autor desconhecido encontrado
no espólio de Fernando Pessoa)