Pela Honra
 

Estou com a cabeça fervilhando como um caldeirão de sopa de ervilhas. E minha cabeça fica assim por mil e um motivos, mas quando os motivos se ajuntam a coisa fica frita mesmo e borbulha sem dó nem piedade.

Sempre tenho mil e uma coisas na cabeça e hoje então mais de uma se sobressai. Participei agora a noite de um workshop em meu Curso de Inglês do qual nunca mudo de nível, mas nem por isso deixo de aprender alguma coisa. Hoje por exemplo o assunto foi sobre valores – especificamente tratamos sobre a honestidade e a humildade.

A honestidade fez me lembrar de minha recente viagem ao Chile. Fomos conhecer Santiago com Abelardo que nos contou coisas muito interessantes sobre a vida no país. Disse-nos ele que, no Chile, geralmente os políticos não ficam ricos, mas que os ricos se tornam políticos – pela Honra. Quando rimos, pois aqui no Brasil poucos políticos o são pela Honra, mas sim pela fome de poder e de riqueza, ele explicou: o Chile, por ter sido um país pobre no início de sua colonização, foi desprezado pelos colonizadores. Ninguém queria participar da colonização de um lugar onde não havia riquezas a explorar. A quem coube finalmente iniciar a colonização do Chile foi alguém muito rico que inclusive aplicou ali o seu próprio dinheiro. Por causa disso, até hoje a corrupção no Chile não acontece como nos outros países da América Latina.Principalmente porque a cultura do povo não aceita.

Com ele ficamos sabendo que o Presidente da República nem tem uma residência oficial fixa – que pode, se quiser, morar em sua própria casa ou, por questões de segurança, alugar uma. Que tanto pode ser casa ou apartamento, mas nunca um Palácio. Contou ainda que o Corpo de Bombeiros em todo país é formado por voluntários, que inclusive gastam para ter essa honra. Isso me fez lembrar meu pai, Presidente do MDB em Lavras nos tempos da revolução e duas vezes vereador – nos tempos em que vereador não tinha salário, mas servia o povo e a cidade pela Honra.

O fato de lembrar-me de meu pai fez com que eu me lembrasse que ele era um homem humilde, mas que na sua simplicidade tinha conceitos muito rígidos de honestidade. No tempo em que as Prefeituras distribuíam bolsas de estudos para as escolas particulares já que o ensino público era terrível, ele nunca usou de seu cargo para solicitar uma bolsa sequer para nenhum dos dez filhos. Pelo contrário, embora nunca tenha sido um homem rico, também nunca recusou ajuda para ninguém.

Como assunto puxa assunto pula agora fora do meu caldeirão de sopa de ervilhas a parte do workshop que tratou da humildade. Entre as muitas situações interessantes, inclusive práticas, tivemos que escolher um pensamento para trabalhar e aplicar ao tema. Escolhemos um pensamento da sabedoria de Confúcio, quando ele fala do caminhar do homem pela vida – quando ele pode aprender tanto com o homem de bom caráter quanto com o homem de mau caráter, pois se de um ele pode absorver os valores, do outro ele pode reconhecer em si próprio os defeitos   que lhe incomodam para  eliminá-los em si mesmo.

Onde está a humildade aí? Pode ser que alguém me pergunte – a humildade está em reconhecer que existem pessoas melhores que você e que podem lhe servir de modelo, mas está também em reconhecer que existem pessoas detestáveis com características que você próprio possui e das quais deveria era tentar se livrar.

Todas as coisas que fervilham em mim vão escoar por um único ralo – o que nos leva até as Eleições Presidenciais de 2010. Eu fico boquiaberta ao perceber que essas três palavras de suma importância na formação de um bom caráter e que todos nos orgulhamos de ser, são desprezadas por candidatos e eleitores. Onde está a Honra, onde a Humildade e onde a Honestidade? A Campanha virou uma lata de lixo onde o que importa é mentir mais e se vangloriar mais para convencer o eleitor. E o eleitor, gente de bem, repentinamente fica cego e surdo para não ver nem ouvir as verdades (do seu partido). Mas não fica cego nem surdo nem mudo quando se trata das verdades do outro partido.  
 
Eu sonho com um país politizado. Um país onde os cidadãos de bem não precisem se envergonhar de serem políticos porque isso é o que todos deveríamos ser: o cidadão da polis (Estado) preocupado o tempo todo com o o seu bem estar mas também com o bem estar  dos outros cidadãos, com a abertura de caminhos para que todos tenham a possibilidade de exercer bem o seu dever e exigir o seu direito. Um país onde não sejamos apenas torcedores dos partidos políticos como o somos dos times de futebol: no meu time só craques, no seu, só pernas de pau.

Da série Viajando por ali e aqui/ crônicas Andinas 3