Turbilhão dos 20 Anos
Sempre vivemos pensativos. É natural do ser humano refletir sobre sua vida. Uns mais, outros menos, outros até transformam-se em estátuas e assim ficam, de queixo apoiado na mão, pensando por toda eternidade.
Passam os anos, as folhas do outono e do calendário, e entre tanto pensar vamos dando nomes aos bois e às etapas marcantes de nossas vidas. Crises. Crises que não tem nada a ver com o desafio do Obama e com o grande pretexto para demissões de nossos tempos. Crises nossas, humanas, pessoais e pelas quais todos passam.
Comecemos pela estrela da vez, muito em voga e lotando aulas de yoga: a Crise dos 30. O clichê da mulher com três décadas, três namoros que quase deram certo e três tias que perguntam todo almoço de família da possibilidade de um casório tão cedo. Sei que se aprofundar nesse tema é repetir o que muitos Sex and The Citys e Friends já vem fazendo muito antes de mim, e o pior: com Jennifer Aniston no elenco. Mas ainda arrisco uma tentativa. Com a Jennifer e com essa Crise.
A Crise dos 30 é o roteiro perfeito para comédias românticas, com suas charmosas protagonistas bem sucedidas na carreira e enfadadas com os homens, que acabam se apaixonando por coadjuvantes longe do padrão da segurança de um colega de trabalho: bons para escolher o restaurante, péssimos para conversar enquanto chega a conta. Nesse roteiro e na vida, o interessante vem do imprevisível, sempre. Aposto um Javier Bardem no “Vicky Cristina Barcelona” que isso acontece.
O que é sabido é que homens continuam espalhando suas sementes até quando durarem o estoque de azulzinha. Vide Julio Iglesias ou o nosso Fabio Jr (hoje mais para Fabio Senior). E as mulheres? Dos trinta adiante é uma corrida contra o tempo e as aulas de biologia. Pescar a tempo um que valha nesse mar de cafajestes, bananas e bons partidos já enlaçados fica mais difícil a cada grão de areia que passa pela ampulheta. O tempo para conhecer, namorar, descobrir se abaixa a tampa ou coleciona unhas para um “sim” sem arrependimentos leva anos, e não pode ser acelerado pelo prazo da prole.
Na prática, a triunfante caminhada para o altar leva muito mais que os minutos de braços dados com papai. Para essas mujeres, penso que a solução é se comportar como em um incêndio. Manter a calma e o charme, não entrar em pânico, e procurar perfumada pela saída mais próxima até a chegada do seu bombeiro.
Dê dez anos e substitua um cromossomo: temos o homem médio da Crise dos 40. E nela uma página em branco para desenhar com letrinhas um novo esteriótipo. O recém-divorciado com a carteira cheia e a cabeleira rala. Já pensou em alguém, não é? Aquele cara de roupas justas e gírias do filho, circulando com o carro do ano e com muitos anos no RG. Ainda não? Vá para a uma balada e olhe pra cima, lá estará ele. Não é o globo de espelhos, é o tiozão de camisa pólo justa do alto do camarote, como que comandando a balada de sua mocidade perdida.
Mas e a dos 20? É de algum sexo específico? Ou uma época de se fazer muito sexo? O fato é que o querido sexo é hour-concour nessa análise. Relacioná-lo a crises é tarefa de terapeutas conjugais ou médicos urologistas. Afinal, se o tempo já faz o favor de melhorá-lo como (e com) vinho, não há necessidade de envolvê-lo nessa análise.
Para muitos só a ideia de que exista alguém que queira tachar a flor de sua idade com uma Crise com C maiúsculo beira o drama e a falta de uma namorada. E concordo. Não é bem por uma crise que passam os jovens de 20 e poucos na tenra idade das oportunidades.
Oras, crise é coisa de gente mais velha ou com dinheiro na bolsa de valores. Da Jennifer Aniston, do quarentão recém-tatuado. Mas péra, eu já sou mais velho! Não sou tão novo assim, ganho minha grana... Formado! Pai, deposita 500, por favor? Quando é a festa? E o próximo emprego? Quero ser foda no trabalho, quero viajar no feriado. Quero a farra, quero a namorada.
Sentiu o mini-drama mexicano? E isso é apenas uma amostra, amigo meu.
Mais que nunca é um período de sentimentos, expectativas, cobranças muito bem misturadas com a intensidade e ansiedades inerentes à idade. Misturado com frio na barriga, como num intenso Turbilhão.
Se imagine com um carro, que rodou entre destinos específicos por toda sua existência automobilística. Levou crianças para o ginásio, jovenzinhos para o colegial, guiou rapazes para faculdade. E agora ele pegou seu primeiro acesso para a rodovia. Uma estrada aberta, plana, com um misterioso horizonte para alcançar e com mais cobranças que os pedágios da Bandeirantes. E quem dirige é você.
A inocência da adolescência ficou para trás há tempos, e agora, o plano bancário Universitário também. Nas palavras do seu banco e do mercado, agora você é um Jovem Profissional. Um jovem. E no Turbilhão, você é jovem em tudo. No trabalho, no amor, na vida.
No amor, esse assunto que rende páginas de elucubrações e madrugadas de pensamentos, neste singelo documento terá somente um parágrafo. Estamos na fase de pré-calejamento. Decepções amorosas inevitavelmente já aconteceram, mas longe de endurecer corações e os fecharem para novas oportunidades. Os hematomas dos pés na bunda logo passam e as lágrimas logo enxugam com as belas perspectivas que aparecem no horizonte. E apesar das baladas - a morada dos 20 e poucos - bons partidos são como bons empregos: normalmente vem por indicação.
No trabalho, vive-se numa corda bamba de expectativas. Acostumados com um padrão que os pais proporcionaram e vendo o seu pequeno salário desaparecer somente no custo de sua vida social, a ansiedade quanto ao futuro profissional aumenta. O emprego é encarado com seriedade, como uma obrigação não só para seus pais, amigos e agregados, mas sua. Se na quinta série o grande sonho era férias sem recuperação, agora o que é pensado antes do sono profundo é estar no trabalho ideal, com o salário ideal. O suporte dos pais conforta, mas amedontra. Até quando ele será dependente da ajuda? Viver bem é caro. Preciso ser bom, ter carreira. E o caminho é sinuoso.
Para muitos os hobbies já amadureceram e se semi-profissionalizam, quase sem querer. Um cybershoter agora pega sua Nikon e tira fotos autorias, uma fã de arte pode muito bem trabalhar com cultura, um cinéfilo ser diretor de cinema, e assim por diante. Apesar do receio em não conseguir proporcionar um futuro pleno como seu passado, nessa geração os sonhos não estão mais tão distantes ou inalcançáveis. Quem os segura de acontecer somos nós mesmos, com o apoio incondicional do receio de não dar certo.
Por estarmos preso nesse Turbilhão, ter uma visão externa é mais difícil. Mas é fácil de perceber que se seguindo o que gosta, o resto é conseqüência. E isso é tudo que temos para acreditar – coisa que não é pouca.
As suas experiências passadas estão enterradas com as Spice Girls e tudo que se refere ao começo dos anos 00. Elas ajudam, são um apoio, mas esta etapa está em branco, esperando para ser escrita como o que ainda resta dessa crônica.
Talvez aí esteja a beleza de tudo. Aquela que como na narração do “Sunscreen”, você só perceba quando tenha ido embora. O turbilhão existe, e não existe outro remédio que não percorrê-lo da melhor maneira possível, segurando-se aos seus sonhos e principalmente, a quem você é.
Que esse princípio de vida adulta tenha todos os turbilhões que mereça, e que você o use para deixar suas conquistas ainda mais saborosas, suficientes para serem imortalizadas como uma estátua , a sua estátua. Algo como um Monumento ao Valeu a Pena.