COMENDO SAL JUNTOS.

Por Carlos Sena


A gente costuma avaliar as pessoas adjetivando-as. Boas, ruins, inteligentes, alegres, tristes, etc., são algumas colocações mais usuais no dia-a-dia. A gente tem essa tendência porque o DESCONHECIDO encontra maior guarida no ser humano. Conhecer o outro, como dizia minha avó, requer comer um quilo de sal em companhia de outrem. Mesmo esse "conhecer" fica sob suspeita, considerando todas as dificuldades que encontramos no parceiro que quer conhecer o outro e no outro que dificulta (ou não) esse conhecimento. No caso de homem e mulher essa complexidade se agrava considerando a questão do afeto, do amor mais precisamente. O jogo da sedução, neste caso, torna-se um elemento a mais. Sempre há um que demonstra amar mais e, provavelmente, esse jogo comece por aí. Se há amor biunivocamente, menos mal. As dificuldades daquele que demonstra amar mais tendem a não serem agravadas, mas continuarão sem o risco do mal caratismo por parte do parceiro. Esse aspecto de personalidade - "mal caratismo",  infelizmente se repete nas relações em que prevalece o interesse material. Como o amor geralmente "cega", o parceiro mau caráter se locupleta da situação para estabelecer seu lado CÍNICO. Podemos observar que todo mau caráter é cínico, embora o contrário não seja verdadeiro nessa mesma ordem.

 “CONHECER o outro", independente do papel social que se ocupe é tarefa quase impossível. Talvez possamos utilizar com mais prioridade "COMPREENDER o outro". A compreensão se adéqua mais a condição humana que temos tanto para compreendermos como para sermos compreendidos. Requer tempo, perspicácia e sabedoria. Dificilmente as pessoas são o que dizem. Melhor observar suas atitudes. Quem mais se acha conhecedor do outro são os pais. Engano. Muitos são os que se descuidam de dar limites aos filhos e se equivocam dando-lhes "tudo de bom e de melhor". A desculpa? - Dar a eles o que não tiveram quando na idade deles. Amor, atenção, carinho, foram minguados ou quase nenhum.
Compreender o outro é bom, independente do papel social que ocupamos. Nas relações de amigo, torna-se imperativo. Como "amigo é coisa pra se guardar" então o cuidado deve ser redobrado, pois não podemos guardar uma coisa sendo outra. Alguns cuidados nesse "compreender" devem ser postos em prática, principalmente quando se generaliza atitudes e opiniões. A regra geral é que cada pessoa é única tal qual expressão digital. Neste aspecto não existe receita pronta. E até pode existir desde que seja uma pra cada pessoa, mas daí se adentra noutra complexidade.

As relações de amor são uma boa referencia para a teoria do CONHECER. Afinal, quem ama de verdade tem no outro além de amor, amizade, afeto, companheirismo, etc. Talvez por isto os grandes amantes sejam mais tolerantes com os outros. Independente dos atores, o ato de amar conduz sofrimento, angústia, solidão, dor, senão não seria amor. É o outro lado do prazer, do nirvana, do êxtase. Quem vive tudo isto, de algum modo, se dar ao direito de ter tido acesso a ao íntimo da outra pessoa e vice-versa...
O bom do CONHECER O OUTRO é a capacidade instalada em cada um para, de certa forma, exercer sobre o outro (no bom sentido) algum tipo de previsão e de controle. O CINISMO, neste momento, terá forte chance de ser barrado na relação. Diante desse tipo de personalidade não se deve ter complacência. Ser radical e dar um basta são definitivos. Os primeiros encontros são sempre cheios de SCRIPTS. Todo cuidado é pouco, mas são nos primeiros encontros que uma pessoa experiente no processo de CONHECER edita, com sucesso, suas primeiras impressões. 


PS - Eu já convivi com pessoas que nem precisou comer um quilo de sal pra conhecê-las. Menos de cem gramas foi o suficiente. Mas já tive experiências longas de grandes amores.