PRIMAVERA 2010

Prof. Antônio de Oliveira

aoliveira@caed.inf.br

Na primavera, sobretudo em determinadas regiões do planeta Terra, tudo fica colorido. Tempo, então, de renovar as esperanças feitas da cor da felicidade, do mistério da vida e do milagre da natureza. Para os humanos, uma questão de “naturam sequere”, lema discutível, mas aplicável ao caso, que convida a viver conforme a natureza, principalmente na primavera.

Segundo Cecília Meireles, “só os poetas, entre os humanos, sabem que uma deusa (a primavera) chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, vem dançar neste mundo cálido de incessante luz...” Essa deusa atende pelo nome de brisa, romantismo, perfume das flores, ipês amarelos, brancos e roxos “com as matas (ainda) intactas, as árvores cobertas de folhas”, coroas de flores que não murcham.

E aí estou eu com minha mania de citações. Ranço de universidade, ambiente acadêmico, que é viciado em referências bibliográficas que a gente nunca sabe se foram mesmo consultadas, mesmo porque quase ninguém confere. Num poema A Confissão do Erudito Moribundo, Geoffrey Strickland destila seu segredo de professor: o de sua ignorância que agoniza com ele. Aqui, pinçado, apenas um verso, revelador da desonestidade científica no que diz respeito aos livros citados e que nunca foram lidos: “The books I quoted and have not read”.

Além disso, citação não seria uma demonstração de nossa incapacidade de dizer e assumir aquilo que já foi dito por outros? Usamos muleta até para isso, sob o nome pomposo de uma capa chamada erudição, capa ora produto legítimo ora produto falsificado, mas que impressiona: – Como fala bem! Como...

Mas, deixa isso pra lá e mantenhamos o vício, que a embocadura já está feita. E o tema, no caso, é primavera, estação do ano que, aqui, no Brasil, pouco distinguimos e destacamos, a não ser pelo interesse comercial na coleção primavera-verão. Primavera, para nós, é estereótipo do exterior, de primavera em flor. Por isso – e dá-lhe citação – gosto da maneira simples e realista como Josué Guimarães, escritor gaúcho, descreve “quando a primavera tira o pólen das flores e fecunda a terra. A pequena parreira ao fundo do quintal estava muito viçosa e com centenas de cachos em formação. O pé de limoeiro-todo-o-ano, o mamoeiro jerivá, a goiabeira, o pé de laranja-do-céu, duas pitangueiras carregadinhas e a horta meio abandonada, com pés de couve, alfaces, salsa e cebolinha verde; o resto, capim forte, inço, chão coberto de folhas mortas”.

Os ingredientes básicos de nossa primavera aí estão: céu todo o ano e horta, ainda que meio abandonada...

Primavera é um estado de espírito. Pode ser uma horta meio abandonada, mas que nunca morre. Sempre tem um amanhã, da cor da esperança. Folhas mortas pelo chão, mas com pés de couve, alface, salsa e cebolinha verde... verde de clorofila, verde de objetivo. Pois é primavera! Verão...

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 20/09/2010
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