Tinonim!
Tinonim!
Sei que para sarar a ferida tenho que chegar até ao ‘carnegão’ e espremer o pus até sair sangue pisado. Mas estas brasas chegam sem avisar e queimam. Queimam como ferro queima em brasa. Arrancam uivos da pele. Em outras circunstâncias, não seriam brasas, seriam apenas boas recordações. E um dia terão de ser boas recordações. Mas, hoje, as boas recordações ainda estão caldeadas com às más.
A caminho da estação de Bercy para apanhar o comboio para Roma para ir ver o tecto da capela Sistina no Vaticano, tive a triste ideia de sair na estação da Defense – Arc.
Ao chegar à rua, vi o meu filho Júlio há vinte e um anos com caracóis ao vento correr fazendo o seu tinonim.
A brasa pegou-me à falsa fé e queimou-me até ao tutáno.
Tinonim! Tinonim! Tinonim!
Ia numa correria em sentido contrário. Não te afastes. Vem. Júlio vem para aqui.
O problema agora é se devo dizer, vem para ao pé de mim ou dizer vem para ao pé de nós:
até agora, na minha vida, um pequeno pronome nunca fez tanta diferença.
Agora, faz a diferença entre a cura e a chaga aberta.
Fugi dali. Dei meia-volta e desci ao metro.
Peguei na caneta e anotei isso no bloco de notas.
Apago brasas com a caneta. Com o bloco.
Casa palavra, cada brasa apagada.
Menos uma!!
Quantas mais brasas, terei de aguentar até sair todo o pus?
Até chegar ao tutano do carnegão?
Desta vez,
uma senhora negra desconfiou
que eu chorava.
E eu não me importei.
Paris, 7 de Julho de 2010
Mário Moura