Quartel General Sem Sentinela.
Quartel General sem sentinela
Theo Padilha
Era o ano de 1966. Logo após a famosa Revolução de Março de 1964. O AI-5. O clima ainda andava quente, entre civis e militares. Eu servia na 5.a Cia do QG da 5.a RM e 5.a DI. Trabalhava no QG da Carlos Cavalcanti, e prestava serviços de plantão na Praça Rui Barbosa. Ali ficavam ainda a 5.a PE e a 5.a Cia de Manutenção. Onde morávamos. Neste quartel aconteceram tantas torturas de civis, que fiquei sabendo só agora através de livros. Eu tinha vindo de Joaquim Távora, norte velho do Paraná. Junto com o Celso Gonçalves e o Juracy Nassar. Depois veio o Hamilton Domingues. Os três eram da Manutenção. Eu servia no Serviço de Embarque do QG. Minha função era fazer passagens para os militares que se deslocavam de ônibus, de navio ou de avião. Ou contratar caminhões de mudança, para os oficiais. Meus pais ficaram quase sozinhos em Joaquim Távora, não era para ter vindo. Era arrimo da família. Mas minha mãe, que era evangélica, concordou. Eu queria. E por um erro vim. Eu ganhava muito pouco, e sempre tirava plantão para os outros soldados que estudavam para ganhar uns trocados. Eles pagavam muito bem. Então estava de plantão quase todas as noites.
Certa madrugada eu fazia minha ronda de costume, para defender o aquartelamento, com um mosquetão, provido de baioneta, etc. Quando vi meu pai do outro lado da rua, muito embriagado. Ele costumava vir para Curitiba, sempre. Era ferroviário. Eu não podia abandonar o meu posto. Dei um grito: “Pai!” Ele me enxergou e veio para a minha calçada. Abraçou-me. E ficamos abraçados por um longo período, enquanto eu pensava. Fiz-lhe um monte de perguntas. Como veio. Quando veio. Se a mamãe estava bem. Se ele tinha dinheiro. Ele mostrou um pacote de dinheiro. Imediatamente, escondi meu mosquetão, numa fenda que havia no quartel, não podia abandonar o posto, mas abandonei. Parei um táxi e levei o velho para a rua Carlos Cavalcanti, onde eu alugava um quarto para minhas saídas na noite curitibana. Chegamos lá, pedi que o taxista esperasse. Fechei o velho por fora no quarto e voltei para o quartel. A minha sorte foi que ninguém notou minha ausência naquela fria madrugada. Talvez com uma boa explicação fosse até perdoado. Mas a última coisa que um soldado pode fazer é abandonar a sentinela. Ainda mais na época que país estava cheio de subversivos.
Joaquim Távora, 9 de agosto de 2010. Copyright ©Theo Padilha.