PERDÃO FOI FEITO PRA GENTE PEDIR.

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O terceiro milênio se descobre questionando o perdão. Isto mesmo, O PERDÃO. A gente fica se perguntando o "porquê" dessa aparente contradição, considerando que o mundo moderno tem sido dominado pela racionalidade, pelo consumo, pelas benesses tecnológicas.

A história do perdão é a historia do próprio homem - um homem que a despeito de tudo e de todos os sistemas e formas de governo, sempre quis ser feliz. Essa felicidade nos parece ter sido sempre obstaculada pelas diversas formas de convivência humana, principalmente na construção da consciência critica. Esta, independente de qualquer conceito é particular, mesmo considerando que somos um pouco do que nossa sociedade nos faz pensar.

O perdão, enquanto SENTIMENTO é construído quase sempre com o beneplácito de alguma religião. A CATÓLICA talvez seja aquela que mais tirou proveito, inclusive financeiro, pois as indulgências (grandes responsáveis pelo cisma, via Martinho Lutero) tinham essa competência. O PERDÃO aos pecados era vendido. Ainda hoje, há resquícios disto: os católicos pagam quase todos os sacramentos. Instituiu-se, nos primórdios da igreja,  o perdão como privativo de DEUS através dos padres e, certamente, cobrava-se caro por um "quilo" de perdão! O mencionado cisma veio dividir a igreja dando origem ao protestantismo que hoje se denominam evangélicos. O  "mercado da fé" capitaneado pelos "bispos Macedos" da vida é coisa nova,  desses tempos modernos de exploração capitalista - eles vendem além do PERDÃO, até um fio de cabelo, com o agravante de dizem que esse fio de cabelo foi de Jesus!

História à parte, o PERDÃO permaneceu em sua concepção mais geral, inclusive pelos evangélicos que ainda hoje defendem que só DEUS pode concedê-lo. Contudo, com as mudanças todas patrocinadas pela sociedade de consumo, pelas grandes concentrações urbanas e, principalmente, diante dos tropeços da igreja católica envolvida em escândalos, o PERDÃO mudou de endereço. Sua concessão deixou de ser privilégio dos padres nos confessionários, mas continuou com sua força interior geradora de “PAZ E CONSCIÊNCIA TRANQUILA”. Não é por acaso que os confessionários das nossas seculares igrejas viraram peças de museu. Esse afastamento dos fiéis que buscavam o perdão dos padres não tirou do homem a necessidade de ser PERDOADO. Neste viés, o homem deixou de se penitenciar pra fora e o fazendo-o, contritamente,  pra dentro se si. Afinal, “perdão foi feito pra gente pedir”... Pedir a Deus, aos padres, mas principalmente à pessoa que ofendemos e sentimos necessidade de ouvir dela o PERDÃO. Como se vê, Deus não está fora dessa construção complexa de sentimentos coletivos. Talvez porque nós somos imagem e semelhança Dele e, por conseguinte, podemos ser perdoados por outro semelhante ou ao nosso próximo igualmente perdoar.

Do  ponto de vista filosófico, o Perdão vai além do socialmente estabelecido. Fica dentro de cada pessoa tanto para perdoar quanto para ser perdoado. São Francisco de Assis já nos ensinava: “É dando que se recebe e é perdoando que se é perdoado”. O perdão pode ser expresso em via de mão dupla em que se ouve do outro a verbalização, mas não necessariamente. Como perdoar é “tarefa” do coração e coração é terra que ninguém anda, a CONSCIÊNCIA se torna um elemento importante. Outros fatores são os valores: pode-se esperar o perdão por uma traição conjugal e não acontecer. O conceito valorativo de traição pode levar o suposto traidor a não se sentir “traidor”, provavelmente porque seus valores machistas sustentam que homem pode, mulher não, por exemplo.

O perdão libera tensões. Quando perdoamos 70 x 7, como diz a bíblia, a nossa consciência vira festa. Vejo nesse ato, uma aglomeração de outras virtudes. Como que se os anjos nos aplaudissem, diante de tamanha grandeza. O perdão é holístico pela sua tri dimensão: não perdoa quem não ama,  quem não é altruísta, quem não tem fé. Perdoar é perdoar-se: a gente se perdoa a si mesmo nesse gesto. Por isto é um gesto que liberta e serve também  para avaliar o tamanho de pessoa que somos. De que adianta sermos grandes, ricos, inteligentes, se não formos capaz de perdoar? É como não ser capaz de amar. É como ser um pouco do repolho: abre-se pra dentro, fecha-se em si; diferente da rosa que, além de dar perfume, abre-se pra fora.

Portanto, fico feliz em ver o PERDÃO  como capa de revista, diante de tantos outros assuntos que poderiam muito bem dar mais lucros aos empresários da comunicação. Talvez porque o capitalismo já nos esteja ensinando lições importantes tipo: “tenho casa, mulher, filhos, bom emprego, casa no campo, na praia, carro do ano, etc., mas sou infeliz. O dinheiro não me deixa feliz e não consigo perdoar a quem me tem ofendido. Estou só no meu apartamento e ninguém vem ficar comigo nesse involuntário retiro, nem a pessoa que amo, diante de tanto que a ofendi sem jamais lhe ter pedido perdão”. O compromisso do perdão é com cada um. Deus fica de “longe” validando esse gesto nobre de encontro com Ele. “Perdão foi feito pra gente pedir”, mas completo: sem exercitá-lo, a garganta fecha, o coração fecha e a gente fica sofrendo com o peito cheio de mágoas... “Mas qualquer desatenção, faça não, pode ser a gota d’água”...


CARLOS SENA. Recife, 30 de julho de 2010.