Homens que correm

Os olhos não se cruzam. As bocas não dizem “bom dia”. Os passos são velozes, apressados. Mesmo que eu trombe em alguém, não posso pedir-lhe desculpas: não dá tempo. Vivo correndo, pois tenho as horas como as piores inimigas. Assim, os dias passam.

Há certos dias em que não entendo quando isto tudo começou. Esta luta desenfreada por algo que não sabemos nem o que é. Se perguntamos a alguém: “por que você quase não vem à minha casa?”, esta pessoa provavelmente dirá que não está tendo tempo para nada, pois tem afazeres demais, problemas demais a serem resolvidos.

Não pensem que estou aqui defendendo um retrocesso na configuração atual em que vivemos. Nada disso. Aceito, de bom-grado, as evoluções que nossa humanidade alcançou.Sem elas, por exemplo,não teríamos chances de cura de tantas doenças que antes dizimavam milhares de pessoas; não teríamos todos os equipamentos digitais de que dispomos e que facilitam nossas atividades diárias.

Por isso, o que não aceito é a nossa submissão às nossas próprias criações. O homem, com sua inteligência, criou um mundo de possibilidades, tecnologias, metrópoles;um mundo no qual pudesse viver de forma mais confortável.Porém, esqueceu-se de si mesmo.Esqueceu-se de que,para desfrutar dos seus feitos, ele precisa estar saudável, de corpo e mente.Necessita ter tempo para si, para as pessoas que ama, para fazer coisas que realmente dêem prazer. Quantos de nós já sacrificamos passeios, fins de semana, almoços com a família, para nos dedicarmos ao trabalho, ao aperfeiçoamento profissional, ao sucesso da carreira...

Temos que nos lembrar de que não somos máquinas. Não funcionamos com programas pré-elaborados, e, por isso, somos nós mesmos os responsáveis por direcionar nossos atos diariamente. Se nós adoecermos, como poderemos continuar realizando os projetos que temos?Como poderemos continuar produzindo em nosso trabalho, sendo profissionais bem-sucedidos, se nos esquecemos de nós mesmos?Temos necessidades básicas que antecedem a realização profissional; mas tais necessidades são deixadas de lado por muitas pessoas, como se não fossem essenciais. Vejo colegas de trabalho sacrificando as primeiras necessidades humanas, como alimentação, trocando horários de almoço por trabalho. Trocando conversas com amigos por trabalho.

Estranho que só nos damos conta disso tudo quando percebemos que os dias estão escorrendo pelas nossas mãos, e que não fizemos quase nada do que pretendíamos, pois nunca dá tempo. A falta de tempo é uma queixa recorrente em muitas bocas.Até mesmo a vida nas cidades interioranas já está mudada. Tomo por base minha pequena Curvelo, cidade em que vivi 17 anos da minha vida, e que, ao visitá-la, vejo pessoas correndo de um lado a outro, sem tempo de olharem umas para as outras.

Que preço alto estamos pagando!Não culpo a evolução em si, mas culpo a nós, homens, que nos embriagamos tanto de orgulho, nos tornamos tão vaidosos de nossas capacidades, que passamos a dar mais valor às coisas produzidas por nós, do que a nós mesmos, os produtores.

Sem tempo para nos cuidar, adoecemos. Ficamos cada vez mais estressados, mais tristes, mais solitários, mais doentes. Tornamo-nos medrosos. Aprendemos a manusear computadores, mas não sabemos olhar para o outro.Esquecemos de como é bom ter um tempinho pros amigos, pra colocar os assuntos em dia.De como é prazeroso vivermos despreocupados, pois nossas cabeças funcionam a mil quilômetros por hora.

Sugiro uma pausa. Sugiro que tomemos um fôlego. Lembremos que, se não tivermos saúde física e emocional, nossa vida pára. Então, não adianta corrermos desenfreadamente, se não nos colocarmos em primeiro lugar. O mundo não anda sozinho, se não houver pessoas. Somos os protagonistas desta história, esta história tão bonita que é a vida!

Laís Pereira
Enviado por Laís Pereira em 16/07/2010
Reeditado em 19/08/2010
Código do texto: T2381828
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