Cuba Libre

Cuba Libre

Jurema era uma moça magra, alta (mais ou menos 1,75 de altura) e de cabelos castanhos, quase ruivos, longos, cheios e bonitos; cabelos que lhe caíam cascateando abaixo dos ombros, enfeitando-os como uma linda moldura. Os olhos dela eu nem reparei direito, devido ao tanto que me perdi em suas profundezas abissais.

Não houve jeito de fugir ao feitiço que brotava dela, junto com o mel daquele olhar.

Quando pus os olhos nela pela primeira vez, foi dançando uma balada, dessas muitas que permearam os anos setenta: lembro-me que esta tinha um refrão mais ou menos assim: “-shah, lá, lá, lá, lá, lá... estrela que cai...”.

Resumo: a dita melodia penetrou em meus ouvidos, e Jurema, faceira como só ela sabia ser, tomou conta de toda minha alma, tendo em vista que os meus jovens vinte e dois anos não eram um páreo muito adequado para os vinte anos dela, pois, com vinte anos uma mulher tem muito mais maturidade do que um homem na mesma faixa de idade. Saímos juntos algumas vezes, não tantas como as que eu gostaria, mas todas as vezes em que Jurema permitiu que eu partilhasse de sua luminosa companhia.

Lembro-me com nostalgia, ainda hoje, de um dia em que estávamos em São Roque, numa dessas festas da Uva, e o último trem já havia partido para São Paulo; não tivemos dúvida: estendi o meu caríssimo casaco de pelo de camelo ao chão e nos deitamos nele, eu e Jurema, debaixo de uma composição que se encontrava parada nos trilhos da estação, e ali ficamos a namorar até a aurora nos acordar para mais um dia.

Não durou muito tempo o meu namoro com Jurema; se muito, por volta de uns seis meses. Da mesma maneira tempestuosa que ela me veio, assim também ela se foi...

Combinamos um dia de nos encontrar no recém-inaugurado Shopping Center Lapa, em um domingo a noite. Enquanto a esperava, fiquei ali, bebericando cuba libre e comendo hambúrguer. À medida que o tempo passava e Jurema não aparecia, mais cuba libre eu ingeria.

O resultado dessa combinação indigesta foi mais do que previsível: uma dor de cabeça infernal e um enjoo que me acompanhou até chegar, miseravelmente embriagado, mais parecendo um gambá enxovalhado, ao apartamento em que morava no Alto da Lapa.

Nunca mais soube de Jurema – e nem também mais quis saber de cuba libre...

... e, depois disso, quis saber menos ainda de hamburger.

Os anos setenta me deixaram a agradável lembrança das calças jeans de camurça e o surgimento das lentes de contato, que me permitiram o abandono dos óculos de grau, podendo finalmente desfrutar de um Ray-ban bausch & lomb.

Vale do Paraíba, noite de Sexta-Feira, início de Janeiro de 2009

João Bosco

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 06/07/2010
Reeditado em 22/08/2019
Código do texto: T2361333
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