PARA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DA MINHA TERRA...
Escrevi esta poesia nos anos 90, quase 20 anos se passaram, e ao relê-la hoje, vejo como está atualizada
Acho lamentável, espero que não se passe mais 20 anos e eu venha a ler estes versos novamente e eles continuem tão contemporâneos
Minha terra tem favelas onde cantam os pagodeiros
Onde soam as cuícas e rugem os pandeiros
E nas praças voam lixos e transitam pipoqueiros
Enquanto os cachorros mijam nos canteiros
Minha terra tem calçadas onde correm os esportistas
Onde encerra a praia a que concorrem os surfistas
E nas avenidas correm os carros conturbando as vistas
Enquanto seu óleo diesel suja as imensas pistas
Minha terra tem calçadões cheios de muambeiros
Onde vendem de tudo que roubam certeiros
Blusas, batons, armas, penicos, chuveiros
Enquanto os donos de lojas perdem mais dinheiro
Minha terra tem grevistas assalariados
Onde pagam trabalhando por seus pecados
E ganham tão pouco que se vêem obrigados
A comer feijão, arroz, ovo e enlatados
Minha terra tem falange, têm bandidos e traficantes
Onde os chefes de quadrilha andam sempre elegantes
E seus carros de luxo, então, muito brilhantes
Enquanto morrem de fomes os pobres feirantes
Minha terra tem político fazendo malhação
Onde todos roubam sem haver qualquer punição
E na rampa sobem sem haver prisão
Enquanto só aumenta a tal da inflação
Minha terra tem bagunça, tem muvuca
Onde roubam cabelos p’ra fazer peruca
E a polícia dorme sem se dar conta dessa vida maluca
Enquanto as meninas apalpam desesperadamente a nuca
Minha terra tem meninos que comem nas lixeiras
Onde jogadores ricos ajeitam suas chuteiras
E nos campos já não fazem mais jogadas certeiras
Enquanto os ouvintes perdem tempo com tantas asneiras
Minha terra tem neguinhos e beija-flores
Onde fazem tanta coisa, mas não só por amores
E nas passarelas transitam políticos devedores
Enquanto os pobres continuam pobres sonhadores
Minha terra tem de tudo que se possa imaginar
Tem biboca, tem cortiço, qualquer lugar p’ra se morar
Só não se tem uma forma de acabar
Com a fome que não pára de aumentar