DO PÂNICO AO HUMOR

Outro dia estava no ambiente de trabalho quando recebi uma ligação telefônica informando que a minha mãe, octogenária, havia sofrido uma queda. Confuso, agradeci ao portador da mensagem, enquanto tremia da cabeça aos pés tentando imaginar a gravidade da situação. Como de costume, passei a tentar me convencer que não havia gravidade no caso, de modo que eu pudesse prestar o devido socorro, sem ter que ser socorrido primeiro. Antes que encerrasse a ligação telefônica a pessoa que enviava a mensagem de voz disse: fique tranqüilo que está tudo bem com ela. Imagine se, numa hora dessas, dá para acreditar em tal afirmação. Não satisfeito, o interlocutor continuou - prolongando ainda mais a minha via crucis mental que ia muito além da distância que me separava da casa da minha mãe – ela diz que só vai para o hospital se for com você! Tratei de encerrar o nosso diálogo com um lacônico está certo e parti célere para o pronto atendimento ao apelo materno. Em menos de cinco minutos chego ao meu destino e lá encontro minha irmã chorosa à porta da casa, além de várias senhoras vizinhas agitadas a tentar descrever o acidente doméstico. Ao tempo que umas se queixavam porque a vítima não quisera ser transportada, para o hospital, por uma delas, outras diziam que ela havia perdido muito sangue. Completando o grupo de socorristas, ainda havia quem procurasse me tranqüilizar quanto ao controle da situação, embora me apontasse um jarro de cimento partido em três pedaços, resultantes do impacto com a cabeça da minha mãe. Só tinha um detalhe: eu ainda não vira a pessoa amada que precisava ser socorrida. Entrei de casa à dentro e fui encontrar mais algumas mulheres que saíam do banheiro conduzindo a minha genitora em trajes sumários. À distância, pude vê-la sendo conduzida lentamente enquanto outras amigas se dividiam na tarefa de vesti-la, penteá-la e perfumá-la. Quando me aproximei, novamente, ouvi-a balbuciar que estava sem segurança nas pernas. Cuidei de ampará-la com o auxílio de uma daquelas senhoras durante o percurso até o carro. Durante o trajeto fiz as perguntas de praxe para casos de acidente daquela natureza, ou seja, se sentia dor de cabeça, náuseas ou sonolência. Ante a resposta negativa, ia me acalmando na medida em que avançávamos pelas ruas a serem percorridas. Quando chegamos ao pronto socorro, solicitei uma cadeira de rodas para minha querida e paciente mãezinha, no que fui atendido de imediato. Deixei minha esposa acompanhando e fui estacionar o carro. Foram feitos exames clínicos e uma radiografia de crânio. Ficamos apreensivos das 10:00 às 12:15 horas, para enfim termos o diagnóstico médico de que nada de mais grave ocorrera e estava afastada a possibilidade de fratura craniana. Levei minha mãe para a minha casa, onde permaneceu sob os nossos cuidados durante três dias a contar do dito dia da queda. No segundo dia de permanência dela e já refeito do susto, recebo a ligação de uma prima, pelo lado materno, quando informo do acontecido. Imediatamente a parenta em primeiro grau pergunta: a tia quebrou alguma coisa? Nessa hora, a ocorrência antes trágica assume outra conotação e eu respondo: quebrou sim, um jarro de cimento! Minha mãe não controlou o riso e sorriu com mais vontade ainda quando meu filho mais velho emendou, olhando enviesado para mim, com um tom de gracejo aliviado: ah, vovó agora eu sei de onde vem a cabeça dura do povo daqui de casa!