Em nome do peixe, do chocolate... Amém!

Estamos no meio da semana santa, às vésperas do dia da Páscoa e, (sem sombra de dúvida) a maior preocupação de todos nestes dias santificados é comprar os ovos de chocolate antes que acabem. Ah, sim! O bacalhau e o salmão também (pois a sardinha tem sempre em estoque).

Longe de mim dizer que isto é um sacrilégio! Dentre as várias lições que o Senhor (cuja morte deu origem a este feriadão) deixou, uma delas é “não julgar”, e esta eu garanto que pratico direitinho.

Assim, cada um que recheie sua cesta do jeito que bem entender ou se empanturre com o peixe que bem quiser (acreditando que fez jejum), a mim não interessa. Só não dá para ficar calada quando alguém me cobra com espanto: “Tu comes carne na quarta e na sexta-feira santas?!!!!”

Confesso que a resposta sai sem graça, tal qual a criança que acabou de ser pega no flagra fazendo uma arte: “Co..co..mo.”

É que quando alguém faz uma pergunta destas pra gente (em plena semana santa) parece que o pecado ganha corpo. A impressão que tenho é de que o pecado cria chifres e rabo e vem me espetar com o seu tridente afiado: “Comendo carne, heim!!!! Ehehehe! Me aguarde!!!

Exagero?! Herança da educação religiosa da época. Nunca me esqueço, quando criança, do dia em que comi sanduíche de presunto e queijo no café da tarde e quando me dei conta que delicioso frio era composto de carne,já tinha engolido o pecado. Passei o dia me martirizando: depois de comê-lo, vomitar me absolveria? Nunca descobri a resposta. Arrisquei continuar com a barriga e consciência cheias.

Superados todos os medos e tabus impostos e inconsistentes, a semana santa me parece atualmente uma grande confusão. Num paradoxo entre carne ou peixe; peixe ou chocolate; chocolate ou roupa ( porque não engorda); Religião e Consumismo disputam acirradamente a hegemonia da data dividindo os torcedores em volta do ringue.

Entre tradições, cultos e encenações; preto, branco e recheado, algo me faz crer que o Coelho vem levando vantagem sobre o Cristo nas últimas páscoas (e o comércio também).

Se é para jejuar, por que não o fazemos ao pé da letra! E me refiro “ à letra” de Jesus.

Se é para se abster, que nos abstenhamos das ostentações, do egoísmo, da soberba, do exibicionismo . Se é para privar-se , que nos privemos da raiva, do rancor, da inveja, da maledicência. Se é para se despojar , que nos despojemos da hipocrisia, da ignorância, da covardia,

Se é para jejuar , então que façamos o jejum espiritual. Este sim, não custa nada, mas vale muito! Além do que transborda a alma do verdadeiro sentido da data.

Concordo que as tradições existam para serem mantidas e cultuadas, porém, quando elas começam a ser perder em meio à evolução da humanidade, misturando-se à diversidade de crenças e filosofias de vida, é hora de atualizá-las.

Para mim, o jejum destes dias confusos vai muito além do cardápio da semana. Numa época em que o pecado anda livre leve e solto, certas mudanças de atitude são a melhor forma de purificação.

E ao responder a quem me questionou se como carne na quarta e na sexta –feira santas, eu completei: Mas se fizer peixe, me convide que eu vou!

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Léia Batista
Enviado por Léia Batista em 30/03/2010
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