RESIGNAÇÃO
A vida segue com a rotina de sempre. Aqui há poucas novidades.
Acordo bem cedo para cumprir algumas obrigações. O trabalho flui mais facilmente quando se faz o que gosta. Aprendi a gostar desse também.
A cidade anda cada vez mais movimentada, o que significa trabalho aumentado. As vezes eu pulo o almoço e acabo jantando perto da meia noite. Mas isso não é uma queixa. Gosto do contato diário com as pessoas; aprendo muito com todos. Já pensei em mudar mas mudanças, agora, geram temores para mim. Fico incomodado só de pensar.
E, assim, vou seguindo essa vidinha de acordar cedo, dormir o suficiente, fumo pouco, ando muito, falo o necessário, escuto abundantemente...
O mundo está em constante evolução, o que traz sobre as pessoas incertezas, turbulências – são os desafios da globalização. Cada vez mais ampliados, esses desafios requerem valores éticos profissionais e pessoais para que se possa desenvolver um trabalho de forma consistente e segura. E acredito nisso!
Regular como a chegada da estação, nunca faltei ao trabalho. É verdade também que, por vezes, enquanto a cidade cochilava, eu apurava meus ouvidos com os Noturnos de Chopin e varava a noite decantando em cada canto das tantas salas o meu humor neurótico, mas a saudade não me dói, nem me rói o peito e, hoje, já não tenho a madrugada como companheira.
Meu colesterol que andava na casa dos 300, hoje não passa de 180, a pressão que oscilava entre 15 por 9 e 17 por 10 não passa de 11 por 8. Perdi 25 Kg. Meu “peso” não passa de 80 Kg . Para um homem de 1,78m, nada mal!
Fui abatido pela crise financeira internacional em pleno vôo de jatinho particular, a 30 mil pés de altura. Quando o mercado veio abaixo, cai mais do que água de cachoeira. Fui tragado pelas bocas da mata!
Andava pelas ruas de São Paulo com um Porsche 911 Carrera prata , que trazia no vidro dianteiro um selo de entrada livre no Jockey Club de São Paulo. Tinha paixão pelo quadrúpede domesticado Andaluz . E, lógico, o Árabe!
Minha casa, de cinco suítes, abrigava entre outras mordomias, salas de jogos, home theather, SPA, sauna, academia, adega subterrânea, uma pequena trilha pra caminhada e, por aí vai... Quer dizer, ia!
Mas os tempos mudaram. E eu também mudei. No distante e tórrido subúrbio , no qual vivo hoje, descobri a simplicidade e a alegria de ser simplesmente eu. Perdi mulher e os filhos pouco me visitam, mas não perdi a honradez, nem sou, tampouco, malevolente. Não sobraram mazelas.
Não largo esse lugar por dinheiro nenhum desse mundo. Agora vejo a lua da pequena janela do meu quarto: uma lua redonda e luminosa e sonho que estou de braços abertos como asas de um avião e, alígero, vou dançando pelo caminho, sem ser visto, como brisa que passa e mal toca nas flores. Aprendi com Manoel de Barros que “a ciência pode classificar e nomear os órgãos de um pássaro, mas não poderá medir seus encantos”. Com esses encantos eu construo, hoje, a minha história!
Dirijo um Monza 97 que tem um adesivo que veio colado no vidro traseiro, quando comprei o carro. Nele, pode-se ler: Quer emagrecer? Pergunte-me como!
*Essa história me foi contada pelo querido amigo, professor Nelson. Ele conheceu pessoalmente o protagonista dessa história!