APROVEITAR A VIDA
Por Carlos Sena
Por Carlos Sena
Viver, a despeito do que pensamos, não é fácil. A dificuldade da vida não está em si, mas na complexidade dos nossos "entornos" sociais que geralmente nos obstaculam na dimensão do que gostaríamos de ser. Devem-nos ver na mesma dimensão e isto nos torna vulneráveis e estimuladores do exercício da convivência.
Pagamos um preço alto pelo conhecimento. Pagamos outro preço caro por evoluirmos na dimensão do humano, na medida em que, com o passar do tempo, a gente vai se livrando de comportamentos duvidosos, mesquinhos, talvez porque a maturidade se faça presente.
Vários serão sempre os preços que pagamos pela vida afora. O principal desta concepção é a certeza que cada fase vivida nos ensina e que, nem sempre, a gente tem a grandeza de perceber no tempo certo e dele tirar os proveitos. Aproveitar a vida é um conceito de muita subjetividade! Isto fica muito claro na juventude quando a força física e emocional nos parece inesgotáveis. Beber, fumar, dançar, trocar a noite pelo dia, namorar, ficar, etc., podem até serem motivos de felicidade, mas dificilmente esses atos perduram como tal.
Aproveitar a vida não é entendê-la meio ruim e "aproveitá-la"! Talvez seja a reconstrução de valores mais duradouros que a maturidade permite sem culpas. Cada idade tem seu encanto. Por isto questiono as idades que a sociedade de consumo estabeleceu como a "terceira idade"... O ser humano é único em seu tempo e esse tempo segue a lógica da natureza em sua dimensão maior: há tempo de plantar e de colher. Há tempo também de morrer! Nessa linha de conceitos, deixaremos facilmente de separar idades para as pessoas. Dentro de cada um o tempo não passa o sentimento não passa, a vida não passa. Até que um dia se sente que ontem não fazíamos tal cousa, mas que hoje cultivamos outras tantas que nunca avaliamos que faríamos.
Aproveitar a vida é ser feliz! Curto e grosso! Descobrir o valor de um papo sadio com amigos, de um encontro com velhos conhecidos dos tempos de ginásio; descobrir o valor de ir a uma feira livre, de recuperar uma camisa apertada, de ir ao cinema no centro da cidade e de ônibus, tirar uma fruta no pé e saboreá-la; descobrir que a pessoa que escolhemos para viver e amar tem atributos simples que nos esquecemos de enaltecer; que as melhores férias não são aquelas que se ter que ir a Europa, Dubai, etc.; descobrir que o lugar mais seguro é nossa casa e tudo fazer para que ela seja agradável, bem decorada, confortável e tenha a sua cara; que comer bem não é comer caro, nem vestir-se têm que ser com a melhor grife; descobrir quantas pessoas maravilhosas estão em nossa volta e que não lhe damos atenção, como o porteiro, a faxineira, o tintureiro, o verdureiro, etc.; descobrir que em nossa volta há pessoas de muita sabedoria, embora não tenham formação universitária; descobrir, enfim, o valor que tem as pequenas coisas...
Aproveitar a vida não é não ter medo, nem dor, nem não ficar na fossa, nem ter momentos desesperadores. Talvez por isto mesmo seja que temos que ser absolutos, pois quando os momentos difíceis vierem a gente logo se busca em novo "roteiro" de vida. Sendo os conceitos tão subjetivos, cada um vai dentro de si e retira as possibilidades para sua recuperação dentro do seu movimento particular. Essa forma de pensar e agir, dificilmente acontece quando somos jovens. O acúmulo de erros e acertos requer tempo, tal como as relações afetivas o necessitam na consolidação do amor.
Aproveitar o tempo é, talvez, não ter mistérios com a vida. Mistérios, a rigor, parecem que se ligam diretamente a religiões, principalmente a católica com seus dogmas e enigmas cheios de reverberações. Cremos que a ligação etérea se faz imperativa, mas na elevação espiritual que cada um seja merecedor. O domínio do capitalismo pode provocar crises existenciais como tudo indica já acontecer. O capital tudo pode e tudo faz, mas não faz a estabilidade do ser total. Imagino que há grandes chances de, em pouco tempo, termos que desenvolver uma ciência do VAZIO. Corre-se muito para ganhar a vida e, às vezes, se gasta todo o dinheiro conseguido para curar as doenças que o "corre-corre" presenteou...