Três mulheres
Ontem, quando vinha embora da casa da Silvia, eram oito horas da noite, cedo portanto, andava apressado, meio de mau humor, e quando chegava no terminal de ônibus da Estação uma mulher se vira para mim, em minha trajetória balística, e pergunta de um ônibus que passava ao mesmo tempo que eu, quase na mesma velocidade:
- É do Aeroporto?
- Não! Respondi secamente e continuei sem me interromper. Fui parar há uns dez metros depois e fiquei observando.
Todo ônibus que parava no ponto, a mulher caminhava até a porta e perguntava se era do Aeroporto, depois voltava para perto de suas duas amigas. Pareciam ter todas os seus quarenta e oito anos, mas bem poderia ser menos. Mudaram de lugar, logo em seguida, para um lugar mais conveniente, mas se eu me virasse e olhasse sobre os ombros, podia ver que continuavam perguntando a cada ônibus que parava se aquele seria o do Aeroporto.
Fui até elas e perguntei:
- Para qual Aeroporto vai?
Seguiu-se então o seguinte diálogo:
- Aeroporto 3.
- Olha, eu vou para o Aeroporto 2, caso o seu passe antes do meu, eu te aviso...
- O 2 também serve!
-Tá! Então eu aviso qualquer um dos dois que chegar.
Ia me virar para ficar de costas para ela, e de frente para os ônibus que chegavam, quando ela me interrompeu, dizendo:
- Eu não enxergo direito sem meus óculos. E esfregava os olhos como que para ilustrar o que acabava de me dizer. - Eu não vejo praticamente nada, então não consigo ver para onde vão os ônibus.
- Claro! Respondi enquanto sorria da forma mais simpática e crédula que conseguia.
A verdade é que aquilo me causou uma certa compaixão, mas não uma dó do outro, aquela compaixão de compartilhar as paixões. Eu sofri ali, junto dela, a mesma vergonha que ela sentia. A vergonha de não saber ler, nenhuma delas, e de ter de explicar porque não lia. Criar uma farsa para justificar não saber ler, como se isso precisasse de explicações, como se não houvessem no mundo pessoas que sabem ler e outras que não sabem.
Fiquei ali observando, logo o Aeroporto 3 passou, ela agradeceu e foi embora. Olhei para ver se ela confirmaria com o motorista se aquele ônibus ia realmente para o Aeroporto 3, mas ela não perguntou. Fiquei observando, porque eu perguntaria, afinal, seria a informação de um perfeito estranho. Imagino que ela tenha perguntado ao cobrador enquanto esperava o troco, mas encaro isso como uma certa consideração por alguém que lhes ajudou: não parar na porta e perguntar. Isso é bondade. Conhecer as letras nem sempre ajuda as pessoas a serem boas e respeitáveis, e não conhecê-las, nem sempre atrapalha nisso.