Uma crônica esbaforida

Preciso escrever a crônica da semana, mas minha inspiração encontra-se entorpecida pelos “40 e tantos” graus da temperatura e afogada no rio de suor que corre por todo meu corpo.
Se tentei o ventilador? Claro!
Como em todos os outros verões da minha vida coloquei as pás miraculosas para funcionar na expectativa de espantarem não só o calor, como as gotículas irritantes que teimam em escorrer de mim durante o meu processo de derretimento.
Não funcionou!
O resultado foi um vento enganosamente quente que fortaleceu ainda mais minha quentura.
Praia! Esta deveria ser a única saída para um escritor refrescar sua criatividade. Lá me fui.
Primeiro ato: o ar condicionado do carro briga com sol que manda, indelicadamente, seus raios tostarem meus braços e pernas. Sinto-me o próprio ovo frito à gosto do meu filho ( molinho no meio e tostadinho nas bordas) sobre o asfalto em fogaréu.
Segundo ato: meu guarda-sol briga com o vento insuportavelmente quente que corre à beira mar. Sinto-me o próprio malabarista tentando equilibrar minha sombrinha na areia ou, para ser mais realista, um ovo frito à milanesa.
Terceiro ato: eusinha brigo com as águas-vivas que resolveram todas banhar-se na minha praia. E numa tentativa pacifista, destas de tirar as gosminhas para amigas, me distraio e levo uma ferroada no bumbum.
Como dói!!!!
Finalmente, quando me sinto um ovo frito à milanesa, tostadinho nas bordas e queimadíssimo no meio; decido voltar para casa.
Para quem pensou que já havia experimentado na íntegra a expressão “programa de índio”, descubro que decepções estão sempre se superando. Neste dia de calor infernal instituí o meu mais autêntico programa furado e o batizei de “programa de ovo”.
Qual o saldo final? Ainda não é o final. O calor não acabou e nem escrevi minha crônica.
Este interlúdio de calor e de dor, me faz pensar “o que nos leva persistir em errar?”
Fui à praia de novo.
Primeiro ato: Dispenso o ar desta vez e desço os vidros do carro para que o vento entre “in natura”. Funcionou melhor. Deduzo com isto que um ovo frito, quer dizer, um corpo frito acaba se acostumando com  a temperatura elevada.
Segundo ato: Deduzo que jamais me acostumarei às latas de cerveja voando imbecilmente pelas janelas dos carros. E nem com o gelo. Além de latas os ocupantes do carro que segue à minha frente arremessam pedras de gelos para atingir qualquer alvo adiante.
Como dói!!!!
Terceiro ato: Chego à beira mar e descubro que uma multidão de veículos se apossou da areia antes que banhistas normais conseguissem fazê-lo. Deduzo que alguma coisa errada estaria acontecendo. A coisa errada tem nome. A Arrancada de Fuscas (na minha linda praia) arrancou a minha paciência, a minha tolerância e a minha vontade de estar ali.
Programa de índio, programa de ovo, programa de fusca.
Voltei para casa.
Qual o saldo final?
Ligo o meu ventilador de teto, encho minha banheira, pego papel e caneta e começo a escrever esta crônica.
Deduzo que a praia no verão é a ÚLTIMA saída para um escritor refrescar sua criatividade. Portanto, desculpem-me se esta crônica não ficou muito refrescante.

 
Léia Batista
Enviado por Léia Batista em 08/02/2010
Código do texto: T2076097