Um parecer sobre a Terapia de Casal
Uma coisa é certa, todo casal quando procura a terapia conjugal tem como intenção salvar o casamento. E chegam com o firme propósito de que ali, na sala do analista, as coisas se acertarão, ou pode ser o fim da linha antes de chegarem na sala de um juiz onde consumarão o término da relação. Geralmente é uma dura tarefa para todos os envolvidos: casal e analista, esposa e esposo, pais e filhos.
Comumente a proposta de se fazer uma análise de casal parte da mulher e com certa relutância é aceita pelo homem. Isto porque para o homem não é tão simples e claro discutir assuntos pertinentes a intimidade do casal ou da família fora de casa, com estranhos, mesmo que este estranho seja um analista. A relutância pode ser justamente porque o estranho é um analista, ou seja, um profissional que só trata de pessoas que estejam com distúbios psicológicos e no entendimento da maioria dos maridos este não é o problema do casal. Acham quase sempre que tudo pode ser resolvido em casa mesmo. Outro fator preponderante, no homem, é a tentativa de minimizar o conflito conjugal, idealizando a situação sobre a importância da mulher na solução do problema deles e por tanto não precisam buscar ajuda em lugar algum.
A mulher por sua vez olha para a conflitiva conjugal de maneira bastante angustiada, vitimizada, porque sente-se sozinha na compreensão do andar ruim da carruagem do casamento deles. Diz que nas tentativas que faz para conversar sobre a relação não encontra ressonância satisfatória e nem cumplicidade do companheiro na mesma direção de resolver o ou os problemas conjugais. Ao contrário, costuma ouvir que ela está procurando "pelo em casca de ovo" ou "fazendo tempestade em copo d'água". Assim pelas diversas frustrações das tentativas de resolver a relação conjugal, a mulher busca ajuda de um profissional. Claro que o caminho até ali na presença do analista não foi tão simples, antes houve tentativas de buscar ajuda entre as amigas, os parentes, etc, Escuta atenta um montoado de receitas e regras, mas nada parece funcionar e consequentemente aumenta as frustrações. E a falta da resolução pode ser justamente por falha na escuta entre ambos. As interferências afetivas (negativas) são muitas e estas só tendem a aumentar a confusão.
Resolver o casamento ou a relação dentro do contexto terapeutico precisa envolver muitos fatores como por exemplo a cumplicidade e o desejo real de promover a restruturação da relação conjugal; precisa uma boa disposição de reencontrar o afeto que um dia os uniu, porque não se pode falar ou pensar em acomodação pelo simples fato de terem consumado a união. Afinal, muitos casais descobrem na dor ou na ameaça de uma separação que para se manter o bom conjunto entre eles é preciso tratar-se com carinho, respeito e como se cada dia fosse um dia a ser conquistado. O afeto que os uniu no início pode não ser mais o mesmo, mas a força dele precisa ser. Sabemos dentro da teoria psicanalítica que todos os afetos sofrem vicissitudes, ou seja, mudanças, mas a força que une uma pessoa ou uma situação pode estar ligada ou deslocada em outra direção, será importante observar qual direção é esta e se possível trazer de volta. O mister da proposta de resolver a conflitiva conjugal será o casal descobrir-se ainda sentindo um pelo outro a admiração, o carinho, a proposta de ficarem juntos e terem sonhos comuns em detrimento das próprias singularidades. Casal onde os conjuges andam sozinhos e tomam direções opostas tendem a distanciar-se da união, entendem casamento apenas como um locus, ou seja, o lugar para morar, dividir as despesas, criar os filhos e manter-se no contexto social da vida de casados e nada mais do que isto.
Acolher as particularidades de cada um dos pares é uma das premissas da relação terapêutica e devolver estas particularidades no contexto conjugal da análise é outra. Há nos mais variados momentos do acompanhamento terapeutico uma tentativa de buscar no analista a cumplicidade e a conjugalidade idealizada, ou seja, imaginam a partir da escuta terapêutica a pessoa certa para compreender todos os males que lhes afligem. O analista precisa estar atento ao jogo e trama conjugal que tenta destruir a triangularização para formar pares, pares cujo intuito é excluir um dos membros da relação.
Na relação triangular o conjunto estará forte, já na exclusão muitos fatores como o ciumes, a inveja, o ódio tornam-se preponderantes e ativos e tendem a só aumentar as dificuldades de aproximação e compreensão da problemática. O analista muitas vezes é levado para dentro da conflitiva conjugal como se fosse parte interagida desta conflitiva, e todo cuidado é pouco para não cair nesta armadilha. Devolver para o casal a forma como eles atuam frente aos próprios problemas, em como projetam no outro as frustrações e de como esperam que as resoluções partam primeiramente do parceiro e nunca de si também, podem ser elementos importantes na direção da compreensão do que chamamos de reencontro terapêutico. O casal ali envolvido precisa saber que não há culpados, ou vítimas, mas sim duas pessoas que por mais variados motivos se afastaram das propostas comuns de uma boa união, ou seja, procurar fazer alguém do seu lado feliz. Como? Fazendo a melhor maneira possivel a sua parte nesta união.
Graça Costa
Amparo, 02/2010.