A CHINA E A PUBLICIDADE
Agora estou convencido de que a China será mesmo uma grande potência em breve espaço de tempo. No País mais populoso do mundo foi aprovada uma lei que proíbe que anúncios publicitários considerados desagradáveis sejam exibidos na televisão durante o horário das refeições, mais especificamente durante o almoço e o jantar.
O cidadão chinês tem muita sorte de ter um governo sensível às suas necessidades. Deveria ter uma lei mundial garantindo a todo ser humano o direito de almoçar e jantar, assistindo aos seus programas e comerciais favoritos. Acredito que com essa medida, a China já se candidata a liderar o planeta. Uma revolução à chinesa pelos direitos dos telespectadores tem o meu tímido e ineficaz apoio.
De fato, é um crime a gente saborear aquele lombo de porco recheado, acompanhado de uma macarronada, e deparar de repente com um anúncio de um remédio para hemorróidas, por exemplo. Mesmo que o comercial não seja muito criativo e rico em imagens, o nosso estômago se sentirá constrangido e ofendido.
O que mais chama a minha despretensiosa atenção, no entanto, é como a humanidade perdeu o culto às tradições gastronômicas. Antes do advento da televisão, as pessoas travavam verdadeiras reuniões à hora do almoço e, principalmente, do jantar. Em algumas residências, reunião era até palavra de ofensa. Celebração, cerimônia seriam palavras melhores para se aplicar. Agora, as pessoas perderam o hábito de sentar-se à mesa e antes de manusear os talhares, passarem à limpo as atividades do dia, os planos, a vida, enfim. As famílias se conheciam e não precisavam de cursos para desvendar o labirinto que hoje se tornou a instituição família. O jantar agora se dá rápido e, em frene ao objeto que se tornou membro da família, em algumas, chefe até. Enquanto o feijão com arroz procura romper o escuro corredor do esôfago, nossos olhos brilham, sonhando com banquetes irrealizáveis que a TV nos oferta. Nossos dentes trituram um bife, enquanto nossa mente calcula o nosso coração sonha. Meia hora finda a refeição, ainda estamos com o prato na mão à espera de uma brecha, mas enquanto ela não vem, a televisão vai distribuindo as nossas tarefas.
Sou apenas um jovem e confesso para a minha vergonha e desolação que não vivi o tempo em que uma janta tinha um caráter mais santo. Confesso com mais vergonha ainda que nem sei se desejaria vivê-lo. O que, porém, faz-me um monstro nostálgico, é saber que a China, que sempre se opôs a essa cultura ocidental, foi contaminada pelo verme da pressa. Roubaram o que havia de China na China. Lá agora, as pessoas comem em frente à televisão. Estamos todos perdidos. A sala de jantar transformou-se apenas num sombrio e triste salão, onde eventualmente, fantasmas sentam-se para saudosas recordações.