Nascemos...Que belezinha!
Nos dão banho em horas certas; comemos na hora determinada, fazemos cocô e xixi e nos limpam. Nos passam uma pomada fedorenta e nem podemos reclamar! Vamos crescendo e passamos a conhecer uma palavra detestável. Já li em algum lugar, a quantidade de Nãos que as crianças ouvem: não suba aí, não deite no chão, não grite! Não pegue nisto! Não desobedeça aos seus avós! Não tire a sandália, ou vai para o castigo! Não quero que você faça isto! Se você tirar nota baixa, vai passar uma semana sem brincar com seus amiguinhos. Não brinque com aquele menino! Não, não, não. São milhares de Nãos.
Adolescemos e os nãos continuam. Não vou com a cara deste sujeito, não ande com ele! Esta roupa não fica bem, vista outra. Não vá para a escola por aquela rua, sei bem porque você quer passar por ali...Não saia sem um casaco, está muito frio. Não sente nesta cadeira, ela é do seu pai. Não ouça esta música. Não leia livros deste autor, eu não gosto dele. Não use este absorvente, aquele é melhor. Não calce tênis sem cadarço, se existe é para ser usado. Não coma tanto chocolate! Não use amarelo, você fica pálida com esta cor. Não forre seus livros com fotos destes artistas! ! O que você diz não tem conteúdo, aprenda a ser mais convincente! Continuam os Nãos. Nesta fase, alguns são necessários. Mas a barganha aumenta: se você for ver este filme comigo, deixo você acampar no sábado. Se você contar isto para alguém, digo que você dorme com um ursinho! Os Nãos, muitas vezes, ditos por capricho dos pais, tios e avós que pensam assim em manter a sua autoridade. E a barganha é o início da corrupção.
Já adultos, ouvimos dizer: não faça vestibular para isto! Siga o exemplo do seu pai! Não faça o teste para aquele concurso, procure um emprego melhor! Não vá para aquela igreja...Por que você não freqüenta a nossa? Não sonhe tanto! A vida é feita das coisas concretas e você já é uma mulher! Não namore este cara, você merece coisa melhor! É cedo para ficar noiva, não pense nisto agora! Não engravide, pelo amor de Deus!
Já casamos, já engravidamos e os Nãos continuam, embora em menor quantidade. Agora o corriqueiro é: Você tem que. Você tem que prestar mais atenção às saídas do seu marido! Você tem que cortar relações com aquela sua amiga! Seus vizinhos não são confiáveis, você tem que manter distância deles! Esta seita, doutrina ou sei lá o quê está mudando você para pior! Você tem que seguir os costumes e crenças de nossa família! Você tem que votar em Fulano, nós devemos favores a ele! Matricule sua filha em outra escola, você tem que visitar a escola Tal, para ver como é bem melhor! ! Ih! A casa ficou feia pintada de amarelo, não pinte o interior de azul, como está pretendendo, pinte de verde! Os nãos continuam e os Tem Que aumentam.
Já na terceira idade, começa tudo de novo. Agora não são apenas os pais. São os filhos, os irmãos, os amigos, os vizinhos, a criatura sentada ao lado no ônibus, o padre, o pastor, o guru: Você não tem mais idade para usar esta roupa, tem que escolher melhor o que veste! Você está ridículo com esta bermuda, tem que vestir calça! (mas é da bermuda que ele gosta!) Você tem que andar à tarde, não pela manhã! Você tem que comer granola, chupar laranja, comer espinafre, ir à missa!
Não gaste seu dinheiro da aposentadoria, vá de ônibus (e a artrose nem deixa o idoso subir aquele escândalo de altura da escada do ônibus). Nem ele (o idoso) gosta de espinafre! Que coisa feia! Beber cerveja com peixe! Você tem que beber vinho...E pouco! (mas ele só gosta de cerveja, ora!) Não sente nesta cadeira! A sua é aquela...Mas que coisa!(a avó gosta de variar e não deixam!) A senhora é muito teimosa, fica no sereno e depois, lá vem o resfriado, as dores nas pernas...Não pode botar a cabeça fora à noite! (quando ela está de cama eles raramente aparecem!) Tem que tomar sol! Não tome anador, tem que tomar aspirina! O vizinho, no ônibus diz: não use esta sombrinha pequena, para a senhora a grande é melhor! Imaginem! Até nisto dão opinião!
Haja paciência. Envelhecemos e lá vêm os nãos (agora como quando criança, eles aumentam); os Tem que e até os “castigos” continuam. A senhora vai ficar nesta cadeira até a hora do banho! Se sair, não tem os biscoitos que tanto gosta! Não calce este sapato! (ela só gosta daquele). Use soutien para sair! Que coisa feia! (a velha não gosta de nada apertado, ora bolas!) Está muito frio, o velho não quer tomar banho, mas o sobrinho diz: ih tio! Seu pé está maus! Dá um banho nele, mãe! A vovó está com vontade de comer uma farofinha com ovo...Está doida? Nem pensar! Depois a gente é quem vai agüentar o mau cheiro dos puns! Fique aqui! Saia daí! Tire isto! Vista aquilo! Jogue fora este suco, tome este! Vamos passar o dia lá em casa! (e os velhos detestam ir para lá!).
Finalmente, os velhos, de “saco cheio”, vem o neto com esta: pai, o vô está fazendo cocô nas calças e a vó quando dá risada faz xixi! Por que "nóis não bota" eles um asilo?
Voltamos a ser crianças e do mesmo jeito que não podíamos reclamar do cheiro da hipoglós, agora também não podemos reclamar, de NADA!
Pois é...Ironia? Realidade? A vida é cíclica? Nada disto! Má criação, individualismo exacerbado, Egocentrismo, Autoridade exagerada, Ausência de compreensão, amor, Compaixão. Falta de respeito mesmo! E o mais importante: ignorância da lei Divina: Honrai seu pai e sua mãe. Fazei ao outro o que gostaria que fizesse com você.
Você não “Tem que” nada, a não ser que seja ainda uma criancinha!