M E D O

Medo? de que? do quê? por que? medo que me irrita, que me alucina, que me desperta, que me alegra, que me cerca, que me detem, que me seduz, que me cala, que me ouve, que me diz: foi mal! medo! de maõs parasitas que me afagam, do medo de serem trocadas por outras. do sorriso que diz palavras bonitas, sem eu sentir que me desafiam para um clarão mais ofuscante. do brilho daquele olhar que entrou pela fresta da minha janela numa manhã de verão, quando tudo que eu esperava era um brilho que chamasse a minha atenção. medo de sentir na pele apenas um toque, e não o som de foguetes explodindo no ar. medo do cotidiano querendo ter forças para se realizar. por que? se desafio as entrelinhas e as inverto num emaranhado de muitas linhas, para que eu tenha o prazer de me envolver nelas. não! não é isso. mas tambem não sei o que possa me afetar, para que eu vá em busca do balsamo que me socorre. não é a batida cadenciada do coração que me diz que tudo na vida é um compasso. uma orquestra que canta no ouvido agudo do violino, me chamando para estar a beira de um precipicio e não sentir maõs que me empurram. mas somente para ouvir o lamento doce que povoa meus ouvidos. medo? da busca incansavel por estradas menos floridas onde quem me orienta é a pedra que fica impassivel no acostamento, tendo como guia a estrela que traça uma reta até ela. dos passos que me lembram da longinquidade de quanto eu pude gritar pelo seu nome. não, não quero folhas que se jogam a minha frente, não quero paraisos com anjinhos barrocos e suas maõs gordinhas querendo me abraçar. não tenho medo da esquina que me espreita, da avenida larqa que me contem, da luz dos postes enfileirados,dos orelhões amarelos me chamando ou dizendo que estão ocupados. do sorvete quase congelado, de cor vermelha, querendo tingir a rosa branca, por causa dos olhos sonhadores que a observam. não me toque com esse medo que é seu, não combina comigo, não é da minha cor preferida, não é esse com o qual eu sonho. não diga nada que não possa me impressionar. não toque essa musica que não é sua. não me venda, nem me troque por um punhado de palavras que são apenas uma junção gramatical. medo do: sorria voce está sendo filmado. não saio bem em foto e o meu lado mais fotogenico não foi enquadrado. da sombra feminina que me acompanha mas não se revela. do meu bolso virado para fora da calça, sem perceber que ele estava furado e eu perdi aquele brinquedo de infancia. não, não é medo nem a falta dele. é a coragem de dizer que não quero, sem ofender, pois não sou bom em ofender e nem seguir adiante. sou louco por, e de,surpresas. quero o instigante como meu vizinho e o bau enterrado no meu quintal. não! não é nem o medo, é a falta, pois só pode haver coragem se houver o medo e no momento estou sem ela.

Di Camargo, 23/11/2009

Di Camargo
Enviado por Di Camargo em 23/11/2009
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