Cada um encontra a sua saída.
Naquela segunda feira, Marcos demorou um pouco a retornar da escola. Atraso atípico. Normalmente ia e voltava com a irmã, dois anos mais velha que ele.
A irmã estranhou que, ao sair da escola, ele já tivesse ido. O quê será que deu nele? – pensou.
– Tem medo de andar sozinho!...
A mãe também estranhou, embora por alguma razão não houvesse se perturbado.
Ambas se espantaram quando a porta do apartamento se abriu e Marcos entrou com seu novo corte de cabelo: moicano radical!
Tentaram pedir explicações, as duas realmente queriam entender o que levou o rapaz tão discreto a tomar tal atitude. Aquela trilha de cabelos eriçados no meio da cabeça – da testa à nuca –, emprestava a Marcos um ar bizarro que em nada combinava com seus modos bem comportados.
A refeição foi em silêncio. No entanto o adolescente parecia muito confortável com o seu novo visual.
Quando o pai retornou do trabalho, a mãe lhe contou a grande novidade e ele passou um bom tempo envolto em seus pensamentos, até que, finalmente, desabafou:
– Onde foi que erramos?
Naquela semana, os pais foram à escola e ao curso de inglês do filho para saber se havia algo estranho com o comportamento dele, se haviam recebido algum aluno novo que tivesse se tornado amigo de Marcos ou algo assim. Mas as respostas foram negativas. Os pais, então, conversaram com os dois únicos amigos do filho que eram também seus vizinhos. Nada no entanto lhes pareceu anormal.
Marcaram uma visita ao psicólogo de Marcos. Quem sabe ele daria uma pista?
– Ele veio sexta à tarde. Estava mais sério que de costume. Ao se despedir, apertou com força a minha mão, olhou nos meus olhos e disse: Você tem razão quando diz que cada um encontra suas saídas. Valeu!
Os pais se entreolharam. Agradeceram ao profissional e se foram.
Quando entraram no carro, o pai comentou:
– Marcos inventou alguma coisa. Precisamos saber como chegou nisso.
Perto de casa, avistaram o filho voltando pra casa sozinho e tranquilamente.
– Ele está saindo sozinho desde segunda feira. Desde que foi ao barbeiro. – disse a mãe ao perceber o olhar indagador do marido.
O pai estacionou o carro sem desligar o veículo; pediu à mulher que ficasse em casa e foi direto ao barbeiro que há anos ele e o filho frequentavam. Enquanto era atendido, conversava com o barbeiro e, displicentemente, perguntou se tinha cortado os cabelos de Marcos recentemente. Diante da negativa do barbeiro, o pai retornou à casa.
Estava mais calmo, não sabia porque; o fato é que estava estranhamente mais calmo.
Ao chegar em casa, foi ao quarto do filho. Encontro-o ensaiando violão.
– Filho, eu quero entender as suas razões para tomar uma atitude tão radical.
– Ah, os cabelos? Não se preocupe não, pai. Tem funcionado legal. Os trombadinhas e os trombadões que me assaltaram algumas vezes, nem me encaram mais. Eu pesquisei na internet. Tinha uns índios americanos, os moicanos, que cortavam os cabelos assim – e apontou a própria cabeleira –, antes de irem pra guerra. Os inimigos ficavam apavorados!
Sorriu, abraçou o pai e concluiu:
– Pai, mãe, irmãs e vizinhos também me olham amedrontados.
Fez uma pausa e prosseguiu, falando muito sério:
– Pai, eu não podia mais ficar me escondendo e nem precisando de babá para sair na rua. Pai, eu sou um homem. Eu cuido de mim. Amanhã vou cancelar o psicólogo e agradecer a ele. Porque ele já deu o seu recado.