Viajando por ali e aqui
Os Pastéis de Belém (4)
 
Débora, a secretária do depto. De Cultura que eu chefio, me pediu que lhe trouxesse de Portugal um pastel de Belém. Entrando no clima eu lhe prometi dar um jeito, mas a única coisa que consegui trazer foram os sachês com açúcar e canela que são servidos juntos com o doce e que acabaram perfumando minha mala de viagem.  De qualquer forma eu comi Pastéis de Belém em sua homenagem. Enfrentamos uma fila quilométrica para conseguí-los, mas hoje já posso dizer que comi a décima quinta melhor iguaria produzida no mundo segundo o Jornal inglês The Guardian. Se Gostei? Bem, eu comi três ou quatro. Se eu falar que não gostei ninguém vai acreditar. Mas tive dificuldade para comer porque a forminha em que é assado é de um papel muito fino, difícil de tirar. Acaba-se mordendo no papel, tanto que comi um e deixei o resto para comer no hotel. Comprei seis, embalados para a viagem. Impossível comer ali, as mesas todas ocupadas. O pastel, que não é um pastel tal e qual conhecemos, mas assemelha-se a uma empada aberta, é bastante doce e o recheio bem amarelo porque leva muito ovo. Chegamos à pastelaria depois de uma visita ao Mosteiro dos Jerônimos cuja história se liga a história dos pastéis. Conta-se que onde é hoje o estabelecimento responsável pela fabricação e venda dos famosos pastéis era uma antiga refinaria de açúcar de cana com um ponto de vendas de comércio varejista. Reza a lenda que o nome do proprietário era Domingos Rafael Alves e que ele era amigo de um pasteleiro que trabalhava no Mosteiro dos Jerônimos. No início do século 19 houve a Revolução Liberal, com o fechamento dos conventos em Portugal e expulsão do clero. Muita gente ficou desempregada e foi então que o confeiteiro, dono da Refinaria, contratou o amigo pasteleiro que passou a fazer o tal pastel de nata que acabou conhecido como Pastel de Belém e tem enriquecido  gerações de portadores da receita secreta. Nessa época Belém ficava longe de Lisboa e já atraia muitos turistas que iam visitar o Monastério e a Torre de Belém e logo a fama dos pastéis se espalhou pelo mundo.

Lisboa foi a minha porta de entrada para conhecer um pedacinho da Europa. Ficamos hospedados no Tiara Hotel, situado próximo ao Parque Eduardo VII e a Praça Marquês de Pombal. Após nos alojarmos saímos para dar uma volta e procurar algo para comer. Não foi fácil. Era sábado e praticamente estava tudo fechado. Achamos um lugar simples, mas agradável e ficamos por ali comendo e papeando. Essa caminhada por uma Lisboa quase vazia permitiu que pudéssemos observar calmamente a arquitetura das habitações.
O Jantar servido ao grupo foi Salada de Alface com Pinhões e Salmão ao Molho de Laranja com acompanhamento de vegetais. Os pinhões portugueses não são como os nossos. São bem pequenininhos, do tamanho de uma semente. São deliciosos. Não como peixe, mas não me aborreci: onde tem pão eu não passo fome e pão é que não falta na Europa. Mas nossa Guia, Madalena, achou que deveria solicitar outra coisa para mim e eu acabei comendo Imancê de Vitela. Quem não sabe o que é carne de vitela ou Vitelo, eu posso contar: é a carne de bezerros machos e jovens. Foi difícil de comer. Nem ao menos consegui dizer se estava ou não saborosa porque fiquei ouvindo os mugidos das vacas chorando por seus bezerros que assim que nascem são separados da mãe e colocados em baias mínimas onde nem mesmo se conseguem se mexer. É uma crueldade, mas não tive escolha. Afinal o baby já estava morto e se não comesse o prato eu acabaria logo no primeiro dia rotulada como a chata da grupo. Mas não sou chata para comer, basta um pedaço de pão. Quanto ao tal imancê acho que deve ser a mesma coisa que escalope.
Foi no dia seguinte a nossa chegada que partimos para o City tour que acabou nos levando até aos Pastéis de Belém. Mas falarei desse reconhecimento da cidade de Lisboa outro dia porque, sinceramente, agora vou chorar a morte do bezerro e pensar seriamente em parar de comer carne.
 
Lavras, 01 de outubro de 2009