Pobre do Bosco (causo - cotidiano)

Ao concluir o mestrado, Leandro, percebeu uma oportunidade de reforçar o orçamento doméstico lecionando. A idéia parecia perfeita: sairia do trabalho às seis, passaria em casa para ver a família, tomar banho e lanchar. Dali, seguiria para a UniUni, na quadra vizinha. Imaginava as oportunidades e experiências que teria no ensino superior, o quanto isso enriqueceria seu currículo.

Porém, logo ele percebeu que, na prática, a teoria é outra. A UniUni era uma verdadeira bagunça, os horários nunca batiam, não havia um conteúdo programático bem definido, o sistema de avaliação era inadequado, os alunos e professores desmotivados...

Frustrado, em menos de duas semanas se demitia, mudando suas expectativas para uma outra instituição, bem mais afastada de casa, mas com melhor estrutura.

Foi exatamente neste ponto que ele reencontrou um velho e grande amigo, Bosco. Um abraço efusivo, a tradicional troca de notícias, sobre a família, os amigos em comum. De repente, Bosco anunciou, feliz:

- Ah! E me formei.

- Puxa! Que legal! Parabéns!! - exultou. - Em quê?

- Direito.

- Hum! Vai "enricar"... Agora é só passar num concurso público e tal... Foi pela federal?

- Não, rapaz. O vestibular da federal pra Direito é concorrido demais.

Lembrando-se de seu desencanto recente, Leandro brincou:

- Só espero que não tenha sido na UniUni....

O sorriso do amigo desapareceu de seu rosto, deixando em seu lugar um olhar legitimamente surpreso e decepcionado:

- Ué? Por quê?

Imediatamente, Leandro percebeu a gafe: foi na UniUni!

Deu novamente os parabéns, desta vez sem nenhuma convicção. Uma pedra de gelo entre eles. Tentou se explicar, mas o amigo considerou-o um esnobe, por estar fazendo pouco caso do curso dele. E o pior é que estava mesmo. A faculdade é ruim, ele sabia do que estava falando. Conhecia a coisa por dentro. É como ver a cozinha de um restaurante copo sujo. Os pratos podem até ser saborosos, mas depois que você conhece como são feitos, sabe que eles não podem fazer mesmo muito bem. Tanto é que passados três anos e meia dúzia de cursinhos, Bosco ainda não conseguiu passar sequer no exame da OAB.

Dia 31 de agosto o MEC divulgou o resultado da avaliação das instituições de ensino superior do País. Foram avaliadas 1613, sendo que apenas 21 obtiveram nota máxima - nenhuma em Brasília -, enquanto 582 ficaram com média insatisfatória. Para estas, há um plano de ação do MEC, mas, até que ele seja efetivo, muitos Boscos estarão saindo para o mercado de trabalho completamente despreparados. Frustração para eles mas, pior ainda, num país com enorme carência de mão de obra qualificada, o diploma, ainda que um diploma fajuto, abre muitas portas. Não parece tão ruim em se tratando de um decorador de ambientes, afinal, depois que ele convencê-lo de que o roxo e o amarelo da sua parede combinam perfeitamente com um enorme pufe azul royal, você até conseguirá segurar o riso ou o choro cada vez que entrar na sala. Mas imaginem aquelas profissões das quais dependem vidas, nas quais um erro pode ser fatal...

Hoje já há mecanismos para que os próprios alunos decidam melhor a instituição em que desejam estudar. Os índices do MEC são divulgados periodicamente, favorecendo uma escolha mais consciente. Claro que as melhores instituições são as que têm maior concorrência no vestibular e, sendo privadas, também as maiores mensalidades. Fazer o quê? Estudar, estudar, estudar. Trabalhar, se for preciso, para bancar as mensalidades. E concluir seu curso com a certeza de que ele fez bem para você, assim como você fará bem para seus possíveis clientes daqui a pouco.

Ou você quer terminar como o Bosco?