Manoel de Barros, O Pantanal e a Arte de Lamber Sapos
Eu que nunca me arrisquei no verso pra brincar de poeta, fico calado.
Parecer e para ser poeta são coisas diferentes. Na verdade, nós somos fecundados com a poesia todo santo dia. Porém, ela é orquídea: precisa de muito cuidado para viver cem anos! Mas, não cuidamos de nós mesmo, não cuidamos de orquídeas e nem do poemas fecundados em nós.
Poemas são tão voláteis quanto qualquer sonho.
Quando eu me voltei pro Pantanal, vi o Manoel lamber um sapo. Sentir o gosto das coisas. "O cheiro das coisas". Sentir as coisas.
Manoel é o exemplo vivo - e eterno - de como pegar poemas voláteis no céiu azul do Pantanal.
Quem dera ter poder tal assim. Mas não sou eterno como Manoel. Não sou ambicioso, vivo o que tenho de viver e se algum dia eu pegar poema, serei o mais breve possível (leia de novo a primeira linha, por favor).
E quanto ao céu azul, às vezes nuvens surgem do nada e do tudo. Um dia inteiro com a família seria abrigo, mas não. Prefiro ficar só.
Já conversei com o Manoel nos meu sonhos. Ele me disse pra mexer no cisco, pra ouvir o silêncio e pegar o canto dos pássaros.
- Como?, perguntava eu
Ele sorria e ia embora.
Eu aprendi, viu Manoel? Teu olhar me ensina mais do que pensas...
Mas ainda não pretendo ser um poeta, prefiro que o canto fique com seu pássaro. Apenas olho, peço abrigo no ninho de poesias do céu azul.
Prefiro sentir e viver...
E agora eu tenho minha orquídea centenária.