Dívida

Há muitos tipos de viciados: em bilhar; baralho; chiclete (terrível!); bingo (só os da minha idade); cigarro. Tenho pena dos fumantes, não pelo mal que causam a si mesmos mas pela perseguição implacável que melhor seria aplicada pelas autoridades aos bandidos e ao seu sinônimo, que não vou mencionar aqui para não ser repetitivo.

Há quem adore futebol, música, viagem. Proliferam os apaixonados por leitura e existe  quem encontra todo tipo de pretexto para  escrever e, de tão viciado, acredita que ainda pode aprender. Sei de um mas não me acuso.
 
Tem gente que é viciada em trabalho, imaginem. Como é que alguém pode ser tão insano a esse ponto? Eu falo por mim, pois quando o meu horário excede a 13 horas por dia fecho o computador e só vou checar os e-mails novamente quando chegar em casa. Não quero nem saber...

Alguns são viciados em cores. O pessoal do Green Peace e do Corinthians , por exemplo, é obcecado pelo verde com algumas sutis diferenças de objetivos quanto a preservação, sustentabilidade...
 
Tem prá todo gosto. Há os apressadinhos, viciados em agilidade e execução. Querem que tudo seja resolvido ontem, que não fique nenhum assunto pendente. Eu me encontro com frequência com um desses que acha que está pelo menos uns 20 anos atrasado nos seus planos e tenta fazer tudo ao mesmo tempo. É um cara teimoso e envelhecido que aparece entre eu e minha auto-imagem toda vez que olho no espelho. Para tipos como esse recomendo um passeio de Maria-Fumaça.
 
Não sei se em algum outro local existe essa possibilidade, mas bem perto de Campinas é possível fazer um passeio que de carro levaria não mais do que 30 minutos, da antiga estação de Anhumas à cidade de Jaguariúna, mas que de trem demora pelo menos o triplo numa composição exatamente idêntica e percorrendo o mesmo trajeto de há 50 anos... Qual o sentido disso?
 
É para que os viciados em agilidade como essa figura mencionada se dêem conta que a vida tem o seu próprio tempo, que há tempo para tudo, que é preciso baixar a bola, ver o sol se por e ver o sol raiar e desligar de vez em quando... Nesse passeio dá prá ver que a paisagem não passa apressada pela janela,  que o verde do mato ainda está como sempre foi,  que os bois indiferentes nem se dão ao trabalho de erguer a cabeça no pasto, que os rios parecem parados no seu próprio calmo correr e  que a fumaça da Maria não é suficiente para poluir os pensamentos e nem os apitos para acordar do sonho. O passado lembrando que o futuro não vai chegar antes do trem à estação final.

Solução? Não é, mas Você ganha algum tempo para refletir ou simplesmente apreciar o trajeto, o que os torna melhores, a viagem e Você.

O Laercio conduziu com competência e dedicação muitas vidas por caminhos como esse e muitos mais.  Um dia ainda farei esse passeio com ele. A pressa me faz ficar devendo coisas como essa ao meu irmão...

 

(Mais uma do Frans, aquele do Mamma Mia... A idéia era exercitar a criatividade escrevendo um texto em que a narrativa passasse por essas três palavras: Viciados – Corinthians - Maria-Fumaça pinçadas ao acaso no "Correio Popular" de domingo). 
Rosso
Enviado por Rosso em 17/08/2009
Reeditado em 21/05/2013
Código do texto: T1759443
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