CHEIRO DE NAFTALINAS
Por Carlos Sena.
(Refeito para nova publicação em 23.07,10).
Hoje tirei para tirar:
a poeira dos livros,
a polia que invadia velhas fotos,
textos vencidos pela rapidez das informações.
Invadi, ali, pequenas coisas que não me incomodavam, mas esperavam que eu fizesse algo inovador, talvez recuperando seus vazios. Tirando o que pude, imaginei me tirando da relação dos “guardados” como que mergulhando num banho de naftalinas que o tempo se encarrega de disseminar, pela falta da nossa ilação com esses objetos simbólicos.
Deixei a lixeira em festa. Preenchi seus espaços.
As prateleiras ficaram mais leves e suaves, aliviadas: não houve despedidas entre as lembranças velhas contidas nos papéis antigos manchados de ontens!
Deixei espaços livres na prateleira para novas histórias, mas ficaram muitos livros empoeirados para o segundo tempo desse jogo disputado entre poeiras e naftalinas.
Tentei jogar tudo fora, mesmo os livros dos tempos universitários. Contive-me. Eles representam certo conforto intelectual, pois foram lidos e, com certeza guardam o perfume do tempo e as marcas das minhas mãos tateando conhecimentos que hoje me matêm vivo.
Não há espaços vazios. Serve-me, aqueles livros, de companheiro. Testemunham um casamento que mesmo acabado, resulta uma amizade forte.
Quando o olhar perdido invade a prateleira, penso que poderia me dar mais espaços; mais VAZIOS para novas investidas intelectivas. Mas como é difícil trocar velhos por novos amores! Caindo na "real" me consolo por tudo que eles me fazem refletir. Afinal, quando for preciso irei buscá-los (os livros) para novas abordagens conceituais - deleites da alma como “O RETRATO DE DORIAN GRAY”, de Oscar Wilde. “Memória de Minhas Putas Tristes”, de Garcia Marques, certamente me remeteriam aos sonhos. Mesmo "INTRODUÇÃO À SOCIOLOGIA" do estimado Sebastião Vila Nova.
Dentro de mim não há vazios assim. Vazio de gente a gente nem sempre sabe administrar com competência, tal qual fizemos com os vazios dixados pelos papéis, livros e fotos antigas jogados fora.
Na lixeira não coube meus anseios de ser mais feliz! A felicidade não se basta em si mesma; as fotos cortadas, jogadas no lixo, não encerram nossas lembranças reais que elas retratam, talvez porque a melhor fotografia seja aquela tirada pela alma. A câmera que o pensamento usa não é digital, nem analógica. Talvez seja tridimensional, pela capacidade extrema de registrar em alta definição tudo que os nossos sentidos resmungam de prazer ou desconforto. Nesse paralelo a tecnologia perde feio, enquanto a gente segue administrando os processos de viver sempre buscando ser feliz; entendendo que tudo tem seu tempo: diferente do futebol que tem dois, existe outros aconteceres permeando nossa existência. No meio desse caminho podemos encontrar pedras, mas certamente flores serão encontradas. Basta que não se cultive rancor, desamor – instintos insuperáveis no azedume da vida.
Agora, neste despedir do inverno, o sol fica meio híbrido. Pela janela, vejo "casamentos de raposas", como nos tempos de infância em Bom Conselho. Ainda não vi o arco-íris se descortinar no horizonte, mas certamente ele ocorrerá. Mês que vem será setembro – com as flores talvez ventos frescos irrompam para arejar meus anseios perenes de felicidade.
Meus VAZIOS não pude colocar nas prateleiras da cafua, mas entrego ao tempo – esse cordial justiceiro que, ao seu jeito, tudo nivela, tudo ensina. Enquanto ele não me interpuser, enceno o texto conciso do nada saber, até um dia, até talvez, até... Quem sabe?
CARLOS SENA
DOS ARRE(DORES) DE BOA VIAGEM – RECIFE-PE