Crônica da Estrada (Abstracto)
Antes de tudo, gostaria de ressaltar que esse texto foi composto no caminho entre Sobral e minha cidade natal Ipu. Um trecho de mais ou menos 100 quilômetros, ou seja, dá para escrever uma bela poesia "nel mezzo del camin".
Abstracto é a paisagem concreta lá fora. Paisagem que corre em sentido contrário do transporte em que me vejo viajando. Viajo pelo abstracto, pois abstraio a paisagem em palavras que se concretizam nestas linhas definida por k-bytes da tela do computador. É como o abstracto das imagens fotográficas das câmeras digitais: nada mais do que dados codificados e intermitentes. E a paisagem se torna abstracta em mim.
O veículo vence o asfalto quente do sol da manhã. São galhos torcidos, galhos secos ou verdes, campos de pasto, açudes e animais, racionais ou não, cruzando sempre o nosso caminho. Meus olhos se tornam amantes da vastidão. De um lado um grande campo, do outro, a Serra de Meruoca. Os caminhos, as imagens que abstraio.
A estrada não é de boa forma. Sempre há contratempos que juramos abstrair de nosso caminhos. Mas, enquanto praguejamos contra o tempo, as flores violetas, os riachos e as garças - a alvura do pássaro e o verde do campo - nos concretizam o ideal. Mas vivo na terra dos cegos e só eu vejo minhas garças. Enfim, sigo.
Já há muito faço esse rumo de volta a minha terra. Passo por paisagens que não se descrevem, mas se sentem. Sentir de forma infinita o abstracto da paisagem. Aí, vejo a chapada da Ibiapaba. Estou em casa e descanso meus olhos cheios de concretos.
Os sonhos que tenho refletem aquilo que abstrai durante o que vi e, cada sonho, se torna, nas linhas de meu poema, um pedaço de paisagem concreta.