O clima está são? (EC)
Dias atrás fui ao centro de São Paulo e, a duras penas, resolvi utilizar o transporte coletivo. Logo que entrei no ônibus vislumbrei lá num canto Vera Lúcia, minha prima. Obviamente, fui me acomodar no assento a seu lado. Ocorre que, como acontece quando a gente se depara com pessoas com quem não se tem muita intimidade, acabamos nos vendo com uma tremenda falta de assunto, razão porque apelei para um banal colóquio sobre o clima.
– Parece que vai chover – disse eu, puxando a conversa.
– Ah! Você resolveu andar de ônibus com os pobres? – desafiou-me ela em tom de chiste. – Eu já tô acostumada a enfrentar o tempo, seja ele qual for. Ou tô no sol de rachar, ou tô no aguaceiro. É ruim ficar exposta, de qualquer jeito.
– Não reclame de barriga cheia! – respondi de pronto – É preciso ver o lado positivo das coisas. É sempre bom estar em contato com a natureza e tirar disso o prazer que for possível. Tentar encontrar a satisfação em ver no dia o que há de bom; em ver no clima, seja ele seco ou molhado, algo que seja recompensador.
– É! Mas o clima nesta cidade é totalmente biruta. Vira de uma hora para outra sem dar chance nenhuma a gente – emendou ela. – Os homens tão destruindo este planeta. Algum dia, ainda, perceberão que a natureza tá nos castigando por isso. Os homens um dia verão! Ah, se verão!
– Não seja tão pessimista, minha cara – tentei confortá-la.
De repente, a conversa parou ali. O papo estava chato mesmo e, para nossa sorte, ela precisou saltar do ônibus, pois já chegara o ponto onde deveria desembarcar. Nos despedimos com a mesma indiferença com que nos encontramos. Pensei comigo: “Eita mulher que reclama de tudo! Coitada da prima Vera! Pobre prima Vera”
Chegada minha vez de saltar do ônibus, contudo, acabei dando razão a ela. Um frio de doer se instalou sem prévio aviso e eu estava ali em mangas de camisa. Passei o resto do dia refletindo sobre a sanidade do ser humano e do planeta. O homem está são? O planeta está são? O clima está são?
Eu mesmo fiquei com dificuldade em ver no dia algum prazer; ou tô no planeta errado. Os homens certamente verão! Tem razão a prima Vera.
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Este texto faz parte do Exercício Criativo “As quatro estações”.
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