UMA QUESTÃO A FLOR DA PELE.

Ontem me chamou atenção uma das chamadas do Jornal Nacional sobre um assalto acontecido no Recife, algo na chamada deve ter me despertado muito, pois parecia não ser mais um daqueles dramas cotidianos sobre mortes e assaltos transmitidos pela mídia. Então quando iniciou o Jornal lá estava eu sentada, o que já não é comum, porque não tenho mais sentido tanta necessidade de assistir os telejornais, mas por fim rendi-me ao momento. O apresentador falava enquanto as cenas eram exibidas. Pronto! Peguei-me sentindo uma angustia imensa frente ao pânico exibido daquela gente enclausurada pelos bandidos que atiravam a esmo e pegasse as balas em qualquer um, nada parecia importar ali, apenas dominar as pessoas para o “êxito” do assalto. Não sei se os senhores se atentaram para as pessoas na porta giratória do Banco? Ali foi onde me ocorreu o impacto maior, pois mostravam que elas, pessoas, estavam confinadas e para sair daquilo quebraram os vidros e uns caiam sobre os outros, era o verdadeiro salve-se quem puder, era a luta pela sobrevivência, era a exibição límpida do Instinto de Vida querendo escapar da Morte. Gente, como ficar tranquila diante de uma barbárie daquelas? O que está acontecendo? Eu ali assistindo passiva a algo vivido ativamente por aquelas pessoas num outro lugar e minhas emoções aflorando a flor da pele indignada pelo horror que nós estamos nos transformando.

Que nós somos constituídos pelos elementos do Bem e do Mal isto é fato. Que no inicio da existência somos mais ativos para o mal do que para o bem isto também é fato; haja ver o lúdico dos bebes, por exemplo, que toma o seio da mãe como propriedade sua e sobre este quer exercer os poderes da sedução e persuasão, caberá a mãe margear a realidade para seu bebe e juntos estabelecerem os limites entre a Realidade e o Desejo. Não podemos sair por aí acreditando que tudo que almejamos é nosso ou está ao nosso alcance, é só Desejar e fixar a idéia no Desejo e pronto a “coisa” estará materializada.

Aqui pode estar a parada dos grandes desvios da atualidade: A fragilidade com que estamos lidando com os nossos valores e os do outro. Vivemos numa Sociedade onde o Ter supera o Ser. Você vale pelo que tem e não mais pelo que é. Humilhados ficam a grande massa que não pode alcançar os mesmos bens materiais que será detido por uma minoria. Aqui não estamos nos referindo se este ou aquele que trabalha mais ou teve mais oportunidades, estamos nos referindo a pura existência de valores onde tudo conta a partir das conquistas materiais e para isto parece que está valendo qualquer coisa. Famílias inteiras deixando de educar valores como a importância do Nome, da Decência, da Honra, do Amor a si próprio – não aquele do narcisismo primário visto lá no Freud, no texto “Introdução ao Narcisismo” (1914), onde o bebe se pensa ser o centro do universo e tudo gira em torno dele mesmo. Vale observarmos o amor a si para compreender o amor ao próximo: se eu me respeito então saberei respeitar o outro.

Entendem que a ética humana e social parece estar mudando de valores? Onde tudo aquilo que antes era orgulho: Nome, honradez, Sabedoria e Amor. Hoje pode ser motivo de descaso e “burrice”. Esperto é a pessoa que aprende a enganar, a mentir, a ser rápido no que faz, porque a qualidade cada vez mais perde espaço para a quantidade e diante de tantas cobranças vamos deixando-nos conduzir sem criticas inteligentes que nos façam fazer parar isto que está aí.. E assistimos passivos na ação, mas ativos na emoção, porque esta não para nunca, mesmo que fique latente, tudo aquilo que a mídia nos apresenta todo dia, maciçamente sem piedade ou acordo se está nos fazendo Bem ou Mal. A nós nos dizem que é para o bem comum: informar e nos manter em dia com as noticias. Tudo chega rápido e em tempo real.

Tempo real. Que tempo real é este de que nos falam quando apresentam uma noticia ou um fato que está acontecendo num outro País ou lugar fora da minha realidade? Não há tempo real. Há sim um fato que está acontecendo, mas o momento a ser apreendido depende de pessoa para pessoas e isto é preciso levar em conta. Cada um de nós reagirá de maneira diferente as mais variadas estimulações, mas o que se assiste hoje é uma tentativa de massificar as mentes, de colocar vida, como se fosse possível, num espaço globalizado, ou seja, dentro de um vidro redondo e tudo girasse igual para todos. “Oportunidades para todos”. Outra mentira deslavada, porque, mais uma vez, cada um de nós entenderá a vida e os valores que nos cabem de maneiras diferentes. Afinal, dentro do seio familiar uma mãe não consegue educar seus filhos todos do mesmo jeito, porque cada um deles nasce com desejos e necessidades diferentes e caberá a ela, mãe, está atenta a isto para ajudar sua criança a arrumar a casa dos Desejos. Atenta a isto, as diferenças e a singularidade (jeitinho especial que cabe a cada um de nós de como dispomos entender, amar e responder aos apelos que chegam de todos os lados), a mãe estará contribuindo para uma vida melhor aos seus filhos e para ajudá-los a interpretar com uma boa dose de Reflexão a vida que estão querendo empurrar para eles: Homens do amanhã. E caberá aos pais, aos educadores, ajudar as crianças a ajustarem dentro dos valores que importam de fato para se viver uma vida digna, em harmonia e paz consigo, com o outro e com meio ambiente.

Entendi com minha indignação e horror diante daquelas cenas que meus valores ainda estão preservados e isto eu devo a educação originada da parceria entre minha mãe e meu pai. Bendigamos o retorno destes dias onde: Nome, tradição, honra, sabedoria e tempo, são elementos que precisam prevalecer ao que está aí, ou seja, uma vida valendo apenas pelo que pode ostentar. Por que do contrário nossas emoções permanecerão à flor da pele e com isto não podermos fazer mais nada a não ser adoecer de tanta passividade.

Graça Costa.

Amparo, 04/04/2009.