Volúpia

O velho Taurídio acordou cedo, feliz da vida. Abriu a cortina e viu o sol brilhar através da janela como uma grande fogueira convidativa no horizonte longínquo. Fez sua toalete matinal, com a calma característica de um homem de 70 anos, trocou de roupa e foi ao quintal chamar seu cachorro.

- General, meu amigo, vamos embora. Hoje é domingo, dia de passear.

O bicho abanou a cauda, deu três latidos e estendeu sua enorme língua para fora, como se fosse uma gaveta totalmente aberta, tão contente quanto o dono. Minutos depois, ambos já caminhavam pelo parque desfrutando aquele dia venturoso.

Dona Hungarina, descendente da melhor estirpe magiar, só despertou porque seu neto foi chamá-la na cama. Apesar de ter dormido bastante durante seus 68 anos, ainda sentia sono suficiente para mais algumas décadas. Era dorminhoca desde criança, quando sentia medo de acordar no frio tenebroso de Buda e Peste, às margens do Danúbio. Lavou o rosto, vestiu a saia dominical e chamou sua cadela, a Bilu.

- Biluzinha, minha querida, vamos embora. Hoje é domingo, dia de passear.

Dona Hungarina e Taurídio caminhavam pela mesma rua arborizada do parque, ao lado do lago, onde nadavam patos e cisnes. Nada sabiam sobre a existência do outro e vinham em direções contrárias. De repente, no momento em que se cruzaram, os cães se olharam e abanaram as caudas. Os dois animais se cheiraram, deram voltas em torno do outro e latiram felizes.

Seu Taurídio e dona Hungarina permaneceram parados, em silêncio, observando a corte que General fazia a Bilu. Alguns cheiros depois, o cão subiu no dorso da cadela com volúpia e iniciou o mais famoso ritual do mundo animal. Quem sabe, até mesmo entre vegetais e minerais.

Os dois donos ficaram perplexos sem saber o que fazer. Pensaram em puxar as cordas que se prendiam às coleiras dos bichos, mas nenhum deles tomou a iniciativa. Neste momento, Taurídio e Hungarina se olharam e sentiram algo há muito esquecido, mas ainda incrustado em algum canto da memória.